Título: Petistas discutem expulsão de Delúbio e querem calote das dívidas
Autor: Mariana Caetano
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/07/2005, Nacional, p. A4

Na véspera de mais uma reunião da executiva nacional para tratar da crise que abalou o partido, petistas reagiram ontem com revolta à revelação do ex-tesoureiro Delúbio Soares de que o PT usou caixa 2 para financiar campanhas eleitorais e outras despesas assumidas a partir da posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A nova cúpula do partido já discute a expulsão de Delúbio e dirigentes sugerem que não sejam pagos os empréstimos irregulares por ele contraídos. "O que temos de avaliar, já que pelo visto as dívidas são irregulares, é quais são legítimas", disse o presidente do PT, Tarso Genro. "As dívidas que forem partidárias vamos fazer um esforço para pagar." Hoje, a sigla reconhece apenas os R$ 20,4 milhões declarados ao Tribunal Superior Eleitoral. Delúbio alega ter obtido "por fora" R$ 39 milhões do publicitário Marcos Valério de Souza.

"Caixa 2 é tão crime quanto mensalão", disse o senador Sibá Machado (PT-AC), integrante da CPI dos Correios, tratando o ex-tesoureiro como réu confesso. "Se Delúbio não pedir afastamento, o partido deve puni-lo e quem mais estiver envolvido." O deputado Devanir Ribeiro (SP) usou argumento semelhante: "Se o ex-tesoureiro agiu sem conhecimento da direção, deve ser punido sim, deve ser expulso. Por muito menos, já expulsamos muita gente. Expulsamos governador, senador, deputado, vereador e prefeito."

O novo secretário-geral do PT, Ricardo Berzoini, lembrou que o caso de Delúbio já foi entregue à Comissão de Ética da legenda. "Se ele feriu o regimento interno do partido e princípios éticos certamente será responsabilizado." Será instaurado hoje processo na Comissão de Ética contra o ex-tesoureiro e o ex-secretário-geral, Silvio Pereira. Ambos pediram, ao deixarem seus cargos na legenda, na semana retrasada, que as denúncias contra eles fossem investigadas.

Apenas o Diretório Nacional pode decidir pela expulsão dos dois, a partir dos encaminhamentos da comissão, o que pode levar meses. "Não interessa expulsar o Delúbio já. Precisamos de tempo para apurar a extensão de tudo o que ele fez e quem está envolvido", ponderou um dirigente. Ele ainda lembrou que o ex-presidente José Genoino também pode ser responsabilizado. "Formalmente, tudo o que diz respeito às finanças é assinado pelo tesoureiro e pelo presidente."

Na sede do PT em São Paulo, os petistas ainda pareciam atordoados diante da revelação de que o seu partido recorrera a dinheiro não declarado à Justiça Eleitoral. Entre os vários dirigentes e parlamentares que estiveram por lá, todos insistiam que o caixa 2 é prática corrente no País, mas nunca em suas próprias campanhas. "É sabido que boa parte dos empresários que contribuem com campanhas não gostam de se identificar", disse o deputado Jorge Bittar (PT-RJ). "Mas na minha campanha nunca houve caixa 2."

Bittar fechou a prestação de contas com dívidas, assumidas parcialmente pelo diretório nacional. O deputado e vários outros petistas insistiram na necessidade de aprovar a reforma política e o financiamento público de campanha. "O sistema é hipócrita, temos de mudá-lo", declarou o deputado José Eduardo Martins Cardozo (SP). "Isso tem de ser uma lição para o País e não somente para o PT", disse Tarso Genro.

Dirigentes insistiram em que não sabiam de caixa 2 no PT. "Nunca fomos informados de nada parecido", afirmou Romênio Pereira, segundo-vice-presidente do partido. "Delúbio não traduz a verdade quando dá a entender que a direção do partido estava informada dos empréstimos."

Outros quatro integrantes da direção da legenda reafirmaram o mesmo: Jorge Almeida (Movimentos Populares), João Felício (Sindical), Valter Pomar (Terceira-Vice-Presidência) e Glauber Piva (Cultura). "A direção anterior, ou grande parte da direção anterior, não tinha conhecimento desse financiamento não registrado", garantiu o presidente Tarso Genro, que chegou a admitir a hipótese de fazer uma declaração de gastos retificadora ao TSE se o PT achar necessário.

Reunido ontem para preparar a reestruturação das finanças da sigla, o grupo especial chefiado pelo novo tesoureiro, José Pimentel, trabalha apenas com os R$ 20,4 milhões de dívidas declaradas ao TSE. "Surgiram muitos fatos novos e teremos de refletir sobre as declarações feitas tanto por Marcos Valério como por Delúbio", avisou Pimentel. Hoje, a executiva deverá aprovar um plano de corte de gastos e renegociação de suas dívidas.

O grupo de Finanças cobrou esclarecimentos de Delúbio, que passou a tarde na sede do partido. Mas ninguém admitiu que esteve com o ex-tesoureiro. "Ele foi reunir-se com os advogados do partido", desconversou Berzoini, um dos primeiros a cobrar-lhe explicações. Disse que o PT só poderia quitar eventuais débitos assu midos pelo ex-tesoureiro depois de ouvi-lo. A executiva deve convocá-lo a fazer isso hoje .