Título: Depoimento de Silvio Pereira preocupa Planalto
Autor: Gilse Guedes
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/07/2005, Nacional, p. A12

O depoimento de hoje do ex-secretário-geral do PT Silvio Pereira à CPI dos Correios preocupa o governo. No Palácio do Planalto, auxiliares do presidente Luiz Inácio Lula da Silva temem que Silvinho, como é conhecido o dirigente licenciado, acabe complicando a situação do governo e pondo mais lenha na fogueira. Não por rancor, mas por ter o hábito de "falar demais", no diagnóstico palaciano. Responsável pelo Grupo de Trabalho Eleitoral do PT nos últimos anos, Silvinho é muito ligado ao ex-chefe da Casa Civil José Dirceu e, quando questionado, não costuma desviar das respostas.

"Se quiserem falar mentiras, que falem. Eu não vou mentir", afirmou ao Estado o ex-secretário-geral do PT, que passou os últimos dias isolado, preparando-se para o depoimento. Até ontem, porém, Silvinho não parecia disposto a detonar nenhuma bomba. Nem mesmo contra o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, com quem tinha divergências.

Dono de temperamento afável, o ex-secretário sempre achou que Delúbio desfrutava de muita autonomia na condução das finanças do partido. Nas conversas com o então presidente do PT, José Genoino, essa era uma das suas principais reclamações.

Silvinho diz que conheceu o publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza - apontado pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) como operador do mensalão - na sede do PT, em São Paulo, durante encontro promovido por Delúbio, em 2003. O nome de Silvinho consta de várias anotações da agenda de Fernanda Karina Somaggio, a ex-secretária de Valério, mas ele assegura que não era seu amigo. Além disso, também desmente a versão de Karina, segundo a qual os dois viviam conversando por telefone.

No depoimento que prestou há 11 dias na Polícia Federal, em São Paulo, Silvinho contou que, como chefe do Grupo de Trabalho Eleitoral, discutiu com Valério assuntos relacionados a planejamento de marketing e propaganda das campanhas do PT. Ressalvou, no entanto, que Valério só atuou nas campanhas de São Bernardo do Campo, Osasco e Petrópolis, já que a cúpula petista optou por contratar Duda Mendonça.

No fim da campanha para as prefeituras, no ano passado, Silvinho comentou em círculos privados que Duda deixou a desejar. À Polícia Federal, o ex-secretário afirmou que desconhecia "qualquer relação comercial" de Marcos Valério com o PT. Mais: que somente "nos últimos dias" tomou conhecimento dos empréstimos feitos pelo publicitário ao partido.

Nas conversas reservadas que tem mantido, Silvinho jura que nunca ouviu falar em pagamento de mesada a deputados da base aliada, em troca de apoio ao governo no Congresso. "Eu nunca recebi proposta indecorosa. Nem do Roberto Jefferson nem de ninguém", disse ele ao Estado.

Desde que deixou a Secretaria-Geral do PT, há 15 dias, ele vem defendendo Genoino. "Nesses dois anos e meio de governo, Genoino foi um dos dirigentes mais éticos do PT, mais despossuído de qualquer apego a poder, a cargos", afirmou. Apesar de ser o homem encarregado pelo PT de negociar cargos nos Estados com os partidos aliados, Silvinho garante que "não tinha a chave" das nomeações. "Eu nunca nomeei ninguém. Sempre quem decidiu foi o governo."

Nos bastidores, o ex-secretário-geral também faz autocrítica. "O PT sempre encarou as alianças como eleitorais: acabou a eleição, acabou a aliança", disse. "Isso nunca evoluiu para uma posição que fosse de contrapartida. Era uma cultura exclusivista, da negação."