Título: Ex-tesoureiro do Rural revela esquema de saque
Autor: Sérgio Gobetti
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/07/2005, Nacional, p. A4

A história secreta da operação dos saques milionários no Rural passa por Simone Reis Vasconcelos - diretora financeira da SMPB -, revela investigação da Polícia Federal. Simone aparece na contabilidade oficial do banco como sacadora de mais de R$ 10 milhões, mas, na prática, ela quase nunca levava o dinheiro. Simone ia à agência do Rural em Brasília e endossava uma autorização que chegava via fax da agência Assembléia, em Belo Horizonte, para terceiros resgatarem as quantias. Pelo menos 100 pessoas, entre políticos e servidores públicos, teriam lançado mão desse expediente, levando somas que variavam de R$ 50 mil a R$ 100 mil. Os nomes estão no arquivo central do Rural, em Minas. As revelações sobre o esquema preenchem 6 páginas de depoimento prestado à Polícia Federal pelo ex-tesoureiro do Rural na agência de Brasília, José Francisco de Almeida Rego. Contador, 50 anos de idade, maranhense de Pedreiras, ele depôs sob sigilo no dia 6 ao delegado da PF Pedro Alves Ribeiro. Ele ingressou no Rural em 1987, como chefe de cobrança, e foi demitido em junho de 2004, depois de ocupar durante dois anos a função de tesoureiro. Rego contou que "Simone assinava o recibo e escrevia o nome de pessoas que iam pegar o dinheiro".

O passo seguinte da operação, revelou o ex-tesoureiro, se dava quando "as pessoas autorizadas chegavam, apresentavam a carteira de identidade e pegavam o dinheiro". Rego disse que "em geral, cada saque era fracionado em outros menores, comumente de R$ 50 mil ou R$ 100 mil, os valores eram redondos". Segundo ele, "para cada fração vinha um fax específico em nome da pessoa que faria o saque". O ex-tesoureiro disse à PF que "suspeitava de alguma coisa errada nesse procedimento", mas os gerentes José Alberto e Lucas Roque o teriam orientado a "fazer o seu trabalho".

O ex-tesoureiro afirmou que pode reconhecer "até por foto" os sacadores. "Em um dos saques, a pessoa se apresentou como assessor parlamentar", declarou. "Também me recordo de uma mulher que sempre chegava de mau humor, vociferando que estava fazendo favor para os outros", acrescentou. A PF indagou se alguém da direção da SMPB efetuou saques. "A Simone", apontou. "Ela ia à agência de Brasília, recebia o dinheiro, mas não levava."

Rego contou que uma vez liberou R$ 200 mil "por engano" a um desconhecido e que o publicitário Marcos Valério de Souza ligou para ele cobrando providências. Mais tarde, o próprio Valério tornou a ligar para o gerente Renato César Alves de Souza reconhecendo que o erro tinha sido cometido por uma secretária da SMPB. "Eu não suportava mais trabalhar assim, pois a pressão psicológica era imensa em virtude desses altos pagamentos", afirmou.

O delegado Pedro Ribeiro perguntou ao ex-tesoureiro se, além da agência de Valério, outra conta registrava saques vultosos. "As empresas Idaq e CNT, sob presidência do vice-governador de Minas, Clésio de Andrade", afirmou. Segundo Rego, o vice - que foi sócio de Valério - não ia à agência.