Título: Dirceu articula contra Tarso no PT
Autor: Vera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/07/2005, Nacional, p. A11

Uma guerra fria é travada nos bastidores do PT: o ex-ministro da Casa Civil, deputado José Dirceu (SP), não quer que Tarso Genro fique na presidência do partido a partir de setembro, quando haverá eleição direta, com voto dos filiados, para a renovação da cúpula petista. Dirceu não se conforma de sair de cena como "a banda podre" do governo e do partido. Faz dobradinha com o ex-tesoureiro Delúbio Soares - que depõe hoje à CPI dos Correios -, para dar estocadas em Tarso. Seu objetivo é mostrar que todos são iguais no partido do presidente Lula. Em conversas reservadas, Dirceu tem dito que não aceita uma disputa entre "éticos e não éticos" do PT. Ex-presidente do PT de 1995 a 2002 - e arquiteto das alianças com partidos de centro e de direita -, Dirceu incentivou a defesa de Delúbio a revelar que todas as campanhas eleitorais petistas foram financiadas por caixa 2. Na prática, a estratégia que agradou ao deputado teve dupla utilidade, pois serviu ao figurino jurídico montado sob medida para livrar o PT de investigação por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.

"Nosso ex-tesoureiro não precisaria ter dito que todas as campanhas do PT têm caixa 2. Poderia até ter usado esse argumento, mas não dessa forma. Sem dúvida foi um recado interno", afirmou ao Estado um deputado do PT que pediu para não ter o nome divulgado.

O líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (SP), não esconde a contrariedade com a estratégia de pôr todos os políticos do PT na mesma vala comum."Cobrei explicações do Delúbio porque nunca fui informado do tamanho da dívida do partido e nem sabia da existência desse Marcos Valério", disse o senador, numa referência ao publicitário apontado pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) como operador do mensalão.

Pelos mais recentes cálculos petistas, Valério fez uma sucessão de empréstimos à legenda, desde 2003, que totalizam R$ 39 milhões - sem considerar juros e correção monetária. Deu como garantia contratos em empresas estatais, escancarando a simbiose entre o partido e o governo.

Na semana passada, Delúbio disse a amigos que o Campo Majoritário - grupo moderado do partido, detentor de 60% dos cargos na direção petista - deve escolher outro nome para disputar a presidência do PT, em 18 de setembro. Não quer saber de Tarso - ministro da Educação que deixa o governo na próxima semana - e muito menos da "devassa" anunciada por ele nas contas da sigla.

Dirceu vai na mesma linha: acha que não merece o bombardeio, está muito aborrecido com Lula, sente-se desprestigiado e não quer perder o naco de poder que lhe resta no PT, o partido que comandou com mão-de-ferro oito anos. Sempre foi no PT que Dirceu renovou suas forças quando travou duras batalhas dentro do governo, principalmente contra a política econômica.

Tarso substituiu José Genoino na presidência do PT há exatos 11 dias, em meio à mais grave crise que abalou o partido e o governo após as denúncias de Jefferson. Em tese, o "gabinete de crise" é temporário, já que haverá eleição para a escolha da cúpula daqui a dois meses.

A troca de Genoino por outro candidato do Campo Majoritário deve ocorrer no sábado. Tarso tem o apoio de Lula, mas, depois de ver o tamanho do rombo no PT, avalia a conveniência de concorrer a um mandato de dois anos. Se depender de Dirceu e de Delúbio, o candidato deve ser o ex-ministro do Trabalho Ricardo Berzoini, deputado federal e hoje secretário-geral do PT.

As correntes de centro e esquerda no espectro ideológico do PT apresentaram seis postulantes à vaga. "Quem é Delúbio para dizer que não quer Tarso na presidência do PT?", perguntou um importante dirigente do partido, numa reunião a portas fechadas, ao saber da resistência do ex-tesoureiro ao nome do ministro da Educação. A Dirceu ainda sobrou alguma condescendência. "Ele está muito magoado porque vê seu sonho indo por água abaixo. Mas pode escrever: o candidato do Campo Majoritário será Tarso Genro."

VETO

Foi o presidente do PT paulista, Paulo Frateschi, que no último dia 9 vetou o nome de Berzoini para comandar o partido no lugar de Genoino. Estava tudo certo para o anúncio de Berzoini após a renúncia de Genoino quando Frateschi - que é muito ligado a Lula - manifestou seu inconformismo. Pior: disse que o PT de São Paulo não aceitava a indicação por achar que Berzoini representava Dirceu.

Temendo mais uma crise, os outros dirigentes do Campo Majoritário consultaram então Tarso. Antes, já haviam recebido resposta negativa de Luiz Dulci, secretário-geral da Presidência, e de Marco Aurélio Garcia, assessor de Relações Internacionais do Planalto. Tarso aceitou o desafio. Berzoini foi escalado para a Secretaria-Geral do PT, na vaga de Silvio Pereira.

Na reunião da executiva nacional, realizada ontem, Tarso defendeu a suspensão de Delúbio até seu julgamento pela Comissão de Ética, mas foi voto vencido.