Título: Quebrado sigilo de ex-assessor do PT
Autor: Thélio de Magalhães e Luiz Maklouf Carvalho
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/07/2005, Nacional, p. A13

O sigilo bancário fiscal e telefônico de José Adalberto Vieira da Silva, preso em flagrante em São Paulo com R$ 200 mil em uma bolsa, e US$ 100 mil escondidos na cueca, foi quebrado ontem pela juíza da 10.ª Vara Criminal Federal Criminal, Paula Mantovani Avelino. Ela acolheu pedido do delegado Hugo Brasioli Sliviski que preside o inquérito. A quebra dos sigilos visa apurar a origem do dinheiro. Para não atrapalhar as investigações, a juíza decretou segredo de justiça. Em Fortaleza, em entrevista coletiva dada no escritório do advogado Neuzemar Gomes de Moraes, José Adalberto disse que está esperando a liberação do dinheiro, um total de R$ 400 mil, para pagar seus advogados, abrir uma locadora de veículos, construir uma pousada em Aracati e levar uma vida privada, afastado da militância política. Não há motivo para o dinheiro não ser desenvolvido", afirmou, recusando-se a dar uma explicação completa para a origem dos quase meio milhão flagrado pela Polícia Federal. "Não cometi crime nenhum e continuo me considerando um homem sério e ético", afirmou. A seguir, trechos da entrevista. Na sua versão, ninguém, ficou sabendo de sua viagem para São Paulo e do dinheiro do seu amigo. Por que tanto mistério, se, como diz, era apenas um negócio normal?

Por um cuidado pessoal. Não queria gerar expectativas que depois não se consumassem como verdadeiras.

Quanto tempo o senhor conhecia esse amigo?

Há anos. Não tenho como precisar o tempo exato, não, mas há bastante tempo.

Se o sr. não o identifica, pode-se até duvidar de que essa pessoa exista.

Paciência. As pessoas estão construindo tantas versões a respeito deste episódio que eu não posso impedir.

O sr. tem como apresentar algum projeto formal desse investimento de meio milhão de reais?

O que é que eu estava planejando era investir entre 40% e 45% desse recurso numa locadora de veículos e o restante eu planejava e planejo montar um negócio agregado a isso, seria uma pousada de tamanho médio.

Quantas pessoas entre seus outros amigos conhecem esse seu amigo?

Algumas pessoas conhecem.

Vários amigos seus, e até adversári os, só se referem ao sr. com elogios, achando-o sério e ético. Como é que o sr. se envolveu nisso?

Vamos colocar as coisas nos devidos lugares. Eu sou suspeito para falar de mim mas continuo me sentindo uma pessoa séria e ética. Estou seguro de que não cometi delito. Eu cometi um equívoco, um erro de avaliação.

Qual foi o equívoco?

Ter tomado a decisão de transportar esses valores daquela forma e não ter avaliado que, sendo petista, ocorrendo o que ocorreu, poderia desencadear toda essa crise.

O sr. não acha que o simples carregar dinheiro escondido já é antiético?

Não. Eu não estava carregando dinheiro do narcotráfico, de quadrilha. Sob esse aspecto não há erro.

Por que o sr. zerou a memória do celular, ao ser preso?

Porque me senti na responsabilidade de preservar dezenas de pessoas que me ligaram para tratar dos mais diferentes problemas.

O sr. já disse que os dólares estavam na cintura, e não na cueca. Qual foi a técnica que o sr. usou para esconder esses dólares?

Coloquei na cintura, apertei meu cinto e pronto. As cédulas estavam amarradas com ligas, embaixo da calça.

Muito incômodo?

Eu iria a Europa do jeito que estava. Mas isso é detalhe. Se o dinheiro vinha na cueca, no chapéu ou pendurado no pescoço, não é relevante.

O sr. tem vergonha do que fez?

Não tenho vergonha porque não sou traficante, criminoso, não estava transportando recurso ilegal oriundo de crime organizado, quadrilha ou narcotráfico. Se fosse dada a possibilidade de refazer, faria de outra forma. Não tenho como me arrepender. Eu lamento que essa imprudência minha, essa atitude impensada tenha ocasionado toda essa turbulência.

Como é que o sr. vê a crise que o partido está enfrentado?

Eu não sou mais petista e não quero comentar problemas do PT.

Por que o sr. se desfiliou?

Expus o PT em demasia. Portanto, não tinha o direito de continuar sangrando o PT.

Não foi pra facilitar a vida do PT, livrando a cara de todo mundo?

Muito pelo contrário.

Desde que começou a crise do PT duas pessoas já mentiram - o Delúbio Soares e o Marcos Valério. Por que se acreditar no sr.?

Ninguém tem obrigação de acreditar em mim.

Como é que o sr. se sente, agora que se desfiliou, de ver quase 20 anos da sua militância jogados no lixo?

Com muita tristeza. Isso eu vou levar para o túmulo.

O sr. abandona a militância?

Totalmente. Para sempre.