Título: Investidor estrangeiro já se preocupa
Autor: João Caminoto
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/07/2005, Economia & Negócios, p. B3

A crise política no Brasil não contagiou os mercados, como mostram os indicadores financeiros do País, liderados pela cotação do real. Mas começam a surgir alguns sinais de que os investidores estrangeiros estão exibindo uma maior preocupação com o Brasil, que poderá se tornar mais pronunciada caso o ambiente político se deteriore ainda mais nas próximas semanas. Em outras palavras, se a crise avançar, a blindagem dos mercados poderá apresentar algumas rachaduras. A explicação para a calma diante da volatilidade política tem sido explicada pelos bons fundamentos da economia, os excelentes resultados das exportações e o ambiente externo favorável, com uma forte liquidez beneficiando os países emergentes. Além disso , o não envolvimento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, nas denúncias serve até agora como uma garantia de que a política econômica continuará seu curso.

Mas ao longo das últimas semanas, a crise brasileira chegou de vez no exterior e é um dos principais focos de atenção dos investidores e analistas que lidam com os países emergentes. Publicações como o jornal Financial Times e a revista The Economist dedicaram editoriais ao assunto. Nos relatórios de bancos, o tema agora é acompanhado diariamente com detalhada atenção. Explicações dos fundos de investimentos para movimentos de venda e compra de títulos brasileiros começam a citar, entre suas explicações, o andamento da crise.

O economista Henry Stipp, do fundo de investimentos Threadneedle Investments, acredita que os números positivos de indicadores como o câmbio não traduzem com clareza o sentimento predominante nos mercados. "As pessoas estão cada vez mais nervosas, principalmente no mercado brasileiro, mas o fato é que os fluxos para o País continuam fortes e isso dá a impressão que todo mundo está tranqüilo", disse Stipp. "Aqui fora, as pessoas ainda não estão cientes do que está acontecendo no Brasil. Elas olham para os números e dizem tudo bem. Mas será que isso vai continuar por muito tempo?"

Segundo um diretor de um banco europeu com forte presença na América Latina, o ambiente externo tem ajudado muito na manutenção de uma clima de tranqüilidade nos mercados diante dos recentes acontecimentos. "Mas alguns investidores estão ficando mais cautelosos, avaliando que em algum momento os efeitos negativos desta crise terão de ser precificados."

Entre os efeitos negativos estão o aumento da incerteza com a eleição presidencial de 2006 e a paralisação do processo de reformas que possibilitariam um maior fluxo de investimentos direcionados ao aumento da capacidade de expansão da economia no médio e longo prazo. "Infelizmente, esse era um momento raro para o País estar avançando, mas entrou em marcha à ré."