Título: 'Vamos acelerar o ritmo do governo'
Autor: Tânia Monteiro
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/06/2005, Nacional, p. A6

Dilma Rousseff, que assumiu a Casa Civil na terça-feira, diz que "não há ingo vernabilidade nem instabilidade"

A nova ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, quer "aumentar o grau de eficiência da máquina" e se concentrar no acompanhamento das ações de governo. "Vamos acelerar o ritmo", diz ela. A substituta de José Dirceu afirma que essa mudança de velocidade não reflete uma preocupação com a reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nem representa uma reação à crise política alimentada pelas denúncias de corrupção contra integrantes do PT e da administração federal. A esperança de Dilma é de que "a economia funcione sem o contágio (da crise política), até porque não existe o que contagiar". Para a nova titular da Casa Civil, o País hoje é capaz de enfrentar dificuldades desse tipo, sem prejuízo para o funcionamento do governo, do Congresso e da Justiça. Ela avalia que no Brasil "não há ingovernabilidade nem instabilidade".

Com retórica cautelosa, Dilma evita, na entrevista abaixo, fazer críticas à política econômica. Ele não reclama nem mesmo do elevado superávit nas contas do governo - como fez em outras ocasiões, por ver no resultado uma retenção de investimentos prejudicial ao País. "Vou cumprir o superávit de 4,25% do PIB porque é uma decisão de governo", afirma.

Qual será sua prioridade na Casa Civil?

O governo vai fazer um esforço de racionalização das atividades. É admissível ter o ritmo menos acelerado quando se está começando. É possível agora, e esta é a orientação do presidente, acelerar o ritmo do governo. Vamos montar uma agenda de ações que devem ser concluídas neste ano e meio que resta. Vamos elencar um conjunto de projetos prioritários que devem ser concretizados.

Esses projetos representariam a vitrine para a campanha de reeleição do presidente Lula?

Tudo que a gente realizar no governo pode ser usado na época da reeleição para dizer: "Olha, nós cumprimos." Mas o objetivo não é esse. O objetivo do presidente é cumprir da forma mais eficiente possível, até o dia 31 de dezembro de 2006, as ações de governo que lhe cabem. Sem deixar que por nada deste mundo haja uma solução de continuidade na gestão da coisa pública e no acompanhamento das obras essenciais - tanto para o crescimento da economia quanto para a inclusão social.

A aceleração desses projetos significa uma reação à crise política?

Não chamo de reação porque cada momento político tem uma característica. Nós estamos atingindo a maturidade democrática. Este País hoje tem chão, tem estrada, para ver simultaneamente uma CPI funcionando sem imobilizar as ações do Congresso, nem tampouco as do Executivo. É todo processo de consolidação democrática dos último anos que permite que a gente chegue a esse ponto. E isso não é algo que qualquer país conquista. Não é uma reação. Nem a sociedade brasileira nem as lideranças do governo do presidente Lula vão concordar com a paralisia da máquina. Nós temos um momento em que é possível que a economia funcione sem contágio porque não existe o que contagiar. Que a política, em termos do exercício das ações de governo, continue. E que ao mesmo tempo se apure tudo que se tiver que apurar. Porque não há nem ingovernabilidade nem instabilidade. Há normalidade , reforço e fortalecimento das instituições.

A senhora fica chocada com tudo isso que está acontecendo no campo política, com o acúmulo de denúncias de corrupção?

Toda minha trajetória de vida e toda a minha prática no exercício da coisa pública foi uma prática em que isso continua me chocando. A gente não pode se acostumar com isso.

O governo Lula se juntou a más companhias, como diagnosticou o ministro Olívio Dutra?

Não acredito que coalizão signifique má companhia. Você não tem de tornar coalizão igual a má companhia, que parece ser a compreensão das pessoas. Não se pode dizer que porque houve coalizão necessariamente haverá práticas de corrupções ou desvios e quando você não faz coalizão não existem essas práticas. Me desculpe, mas isso é uma forçação de barra e é errado porque ninguém pode chegar ao monopólio da conduta reta. Nem eu pretendo ter o monopólio da conduta reta porque ele não está em canto algum. Tem alguns locais que a probabilidade de aparecer práticas indevidas é maior, mas não evita que apareça em outros lugares, de forma menor. Mas rotinas melhores evitarão práticas indevidas. Portanto acredito que é possível fazer coalizão em alto padrão.

Como vai funcionar a Casa Civil a partir de agora?

A orientação do presidente não só para a Casa Civil, mas para todos os ministérios, é aumentar o grau de eficiência da máquina. No meu caso, basicamente, o que pretendo é ficar mais focada no acompanhamento das ações de governo e na tramitação dos processos que aqui desembocam. As questões relativas à articulação política, a definição de nomeações essas coisas, ficarão mais afetas à Secretaria de Coordenação Política.

Com Dirceu, a Casa Civil coordenava todas as nomeações para cargos de confiança. Isso vai mudar?

Simplesmente o processo de acompanhamento disso passará para a Coordenação Política, inclusive porque a Abin não está aqui na Casa Civil, está no Gabinete de Segurança Institucional.

A senhora que não quer mexer com nomeações?

Acho que é preciso focar no objetivo. Eu prefiro desbastar da Casa Civil as questões que não são as centrais e tratar fundamentalmente do acompanhamento das ações de governo.

E a liberação das emendas feitas pelos parlamentares no Orçamento da União?

Ela irá também para a articulação política, que vai cumprir o papel de coordenar as relações entre o Executivo e o Legislativo, entre as diferentes esferas da Federação. Isso não significa que eu, eventualmente, e até mais do que eventualmente, sistematicamente, não tenha também uma interface com os governadores, à medida que eles tiverem interessados em ações concretas de governo.

A senhora identifica resistência da área militar do governo por causa de seu passado de combate à ditadura?

Me desculpe, mas não acredito que isso ocorra na área militar. Isto está me soando a fala do passado. Vozes e eco do passado. Acredito que nós estamos numa democracia. Isso é ridículo.

Agora na Casa Civil a senhora vai lutar contra a conclusão da usina nuclear de Angra 3?

Eu não demonizo nada. O Ministério das Minas e Energia disse que existem fontes energéticas mais baratas. Assim sendo, damos preferências a elas e não a nuclear.