Título: Juro real brasileiro continua a ser o mais alto do mundo
Autor: Renée Pereira
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/07/2005, Economia & Negócios, p. B5

Apesar de o Comitê de Política Monetária (Copom) ter encerrado no mês passado o ciclo de alta da taxa Selic, em 19,75% ao ano, o juro real do Brasil continua em alta e ocupa, com folga, a liderança do ranking mundial. Levantamento da consultoria GRC Visão mostra que a taxa brasileira - descontada a inflação projetada para os próximos 12 meses - alcançou 14,1% ao ano, quase três vezes o juro de 5,1% do segundo colocado, a Hungria. No mês passado, a taxa do Brasil estava em 13,9% e já era a maior do mundo. O aumento de 0,2 ponto porcentual, mesmo com a estabilidade da taxa nominal, deve-se exclusivamente à queda da projeção da inflação para os próximos 12 meses, de 5,11% para 4,97%, afirma o economista da GRC Visão, Alex Agostini. A manutenção da Selic, esperada pelo mercado para a reunião do Copom que começou ontem e termina hoje, não deve alterar os juros reais do País.

Segundo Agostini, trata-se de uma situação crítica. "Além da taxa extremamente alta, o País ainda conta com a instabilidade política, o que afasta os investimentos. Com juro real de 14,1%, as empresas preferem investir no mercado financeiro a expandir a produção", argumenta ele. "Novos investimentos, somente de companhias exportadoras, que não sofrem tanto com o ambiente doméstico."

Em setembro do ano passado, quando o Copom iniciou o ciclo de aperto monetário para conter a inflação, os juros reais do Brasil estavam em 9,5%. De lá pra cá, a taxa só subiu. Enquanto isso, a Turquia, que já ocupou a liderança do ranking, pegou o caminho inverso e já caiu para a terceira colocação, com taxa de 4,7% ao ano. Segundo o levantamento da GRC Visão, o segundo lugar foi ocupado pela Hungria (5,1%).

Agostini destaca que em um ano a Turquia reduziu os juros nominais de 22% para 14,3% e a inflação, de 9,6% para 8,8%. "Ela superou os problemas internos, reduziu a inflação e a taxa de juros. Aqui, os índices de preços caem, mas os juros continuam no mesmo patamar."

O Brasil não só disparou na liderança dos maiores juros reais do mundo como ficou distante também das médias das demais economias. De acordo com o estudo da GRC Visão, os juros reais médios dos 40 países analisados estão em 1,3%. No caso dos juros reais dos países desenvolvidos, a taxa é de 0,7% e dos países emergentes, de 2,1%.

No ranking das maiores taxas nominais, o Brasil também é líder, com uma Selic de 19,75% ao ano. Em segundo lugar está a Venezuela (17%) e, em terceiro, a Turquia, 14,3%.

A expectativa da consultoria é que na reunião de agosto já haja corte na Selic. Agostini afirma que, tecnicamente, haveria espaço para um corte já nesta reunião. Mas, com tantas incertezas políticas, a tendência é que o BC mantenha mais uma vez o conservadorismo. A LCA consultoria também aposta que a retomada da redução da Selic terá início em agosto, mais cedo do que a expectativa predominante no mercado.

A consultoria aposta numa Selic de 17% no final de 2005. A justificativa está no bom comportamento da inflação, corrente e projetada. O principal fator de risco, no entanto, continua sendo o ambiente político mais tenso e a possibilidade (crescente, mas ainda pequena) de que ele contagie as expectativas econômicas.

Para o economista e sócio da Global Financial Advisor, Miguel Daoud, o Copom já poderia retomar os cortes da taxa de juros nesta reunião. "O passado já foi. Eu acho que o Copom tem que ser coerente é com o presente, que mostra uma inflação corrente e futura em queda", diz ele. Para Daoud, o BC já não mais poderá usar a desculpa da inflação alta para manter o atual patamar de juros, de 19,75% ao ano.

A aposta majoritária do mercado financeiro, entretanto, é que a Selic seja mantida em 19,75% ao ano neste mês. Boa parte dessas instituições financeiras acredita que novos cortes só virão a partir de setembro.