Título: CPI identifica 46 pessoas e saques do mensalão superam R$ 25 milhões
Autor: Sérgio Gobetti
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/07/2005, Nacional, p. A4

A rede de sacadores das contas no Banco Rural das empresas do publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza já chega a 46 pessoas e soma a cifra de R$ 25,5 milhões, de acordo com o levantamento mais atualizado da CPI dos Correios. Os técnicos da comissão estão analisando minuciosamente os documentos bancários e detectaram ontem pelo menos mais dois nomes-chave na lista de saques milionários: o economista Rodrigo Barroso Fernandes, braço direito do prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel (PT), e a publicitária Zilmar Fernandes da Silveira, sócia da agência Duda Mendonça e interlocutora habitual do ex-tesoureiro Delúbio Soares. Pela quebra do sigilo bancário da conta da SMPB no Rural, a CPI verificou que a publicitária sacou na boca do caixa, numa agência da Avenida Paulista, em 30 de abril de 2003, a cifra de R$ 250 mil. Já o economista, que foi coordenador financeiro da campanha de Pimentel no ano passado e atualmente ocupava a presidência da Fundação Municipal de Cultura, teria sacado na boca do caixa, em Belo Horizonte, a quantia de R$ 274.167,36 em 12 de agosto de 2004. Mas Rodrigo Barroso nega que seja ele. "Adianto que estarei tomando as providências jurídicas cabíveis para apurar se a inclusão do meu nome nessa lista é produto de equívoco ou má-fé", disse ontem em nota à imprensa.

A cópia da carteira de identidade do economista e sua assinatura no verso do cheque nº 414.441, do Banco Rural, fazem parte dos documentos de posse da CPI. Seus assessores sugerem que a assinatura não é verdadeira. Rodrigo Barroso pediu afastamento do cargo para se defender.

Além dele, aparecem na lista de sacadores inúmeros outros nomes de segundo escalão na política mineira, como o petebista Cantídio Cotta de Figueiredo, ex-secretário de Saúde de Coronel Fabriciano (MG), que em 2004 coordenou a campanha do candidato do PFL, Paulo Antunes, à prefeitura de sua cidade. Em agosto do ano passado, ele sacou R$ 68 mil da conta da SMPB no Rural, mas diz não conhecer nem Marcos Valério, nem Delúbio, nem o correligionário e deputado Roberto Jefferson, autor das denúncias de que o dinheiro serviria para alimentar o mensalão.

"Naturalmente recebi dinheiro de vários lugares, mas não conheço essas pessoas citadas, nem lembro como foi. A tradição do País é que ninguém declara tudo que gasta e quem doa também não quer aparecer", resume o petebista, reproduzindo o discurso adotado pela cúpula do PT para banalizar o caso.

Os documentos da CPI mostram elevada soma em dinheiro sacada das contas de Valério por dois importantes assessores de dois partidos da base governista. Jacinto Souza Lamas, ex-tesoureiro do PL, arrecadou R$ 1,35 milhão, e João Cláudio de Carvalho Genu, chefe de gabinete do líder do PP na Câmara, José Janene (PR), outros R$ 1,15 milhão.

DIRIGENTES PETISTAS

Apesar da versão de Delúbio ser de que o dinheiro provinha de empréstimos bancários feitos por Valério e de que era canalizado para os diretórios regionais do PT cobrirem despesas não contabilizadas de campanha, apenas três dirigentes regionais - além do assessor de Pimentel - foram identificados até agora como sacadores: Vilmar Lacerda e Raimundo Ferreira da Silva, presidente e vice-presidente do PT do Distrito Federal, e Josias Gomes, deputado federal e presidente do PT baiano.

Nos demais saques feitos por petistas, a relação com o suposto esquema de caixa 2 é no mínimo duvidosa. Um exemplo: Márcia Regina Cunha, esposa do ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP), sacou da agência do Rural em Brasília R$ 50 mil das contas da SMPB apenas um dia depois de seu marido ter recebido Valério para uma reunião em sua residência oficial.

As mesmas dúvidas recaem sobre os saques feitos pela assessora do líder do PT na Câmara, Paulo Rocha (PA). A CPI confirmou que Anita Leocádia sacou R$ 470 mil do Rural, desmontando a explicação inicial do parlamentar, segundo a qual a assessora teria estado no prédio em que fica o banco para uma consulta médica.

"Aquilo que o Jefferson dizia lamentavelmente é verdade. O governo pode desistir da Operação Paraguai", disse o deputado Onyx Lorenzoni (PFL-RS), referindo-se à manobra dos petistas para explicar a motivação dos saques em dinheiro.

No total, foram sacados R$ 21 milhões em dinheiro da SMPB e R$ 4,5 milhões da DNA, a outra agência de publicidade de Valério. Os empréstimos efetuados pelas empresas do publicitário com aval em contratos com o governo somam R$ 55 milhões ou R$ 93 milhões em valores atualizados.