Título: Investidor não vê risco de ruptura
Autor: Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/07/2005, Economia & Negócios, p. B1,3

Administradores de fundos de investimentos frustram-se com crise política brasileira, mas descartam instabilidade e fuga de capitais

WASHINGTON - A idéia de que a crise política que paralisa o governo Lula não afetará a economia é tão fantasiosa quanto os temores de que ela desencadeará uma fuga de capitais e jogará o País em mais um debilitante período de instabilidade. Analistas e administradores de fundos de investimentos ouvidos pelo Estado, na semana passada, coincidiram em que o sentimento dominante é mais de frustração pelo que o Brasil, por causa da crise, deixará de fazer nos próximos meses para consolidar o caminho do crescimento sustentado, em meio a uma conjuntura internacional favorável, do que de preocupação com a hipótese de o País abandonar esse caminho por uma aventura populista.

"Os mercados sentem-se aliviados por causa de três fatores básicos", disse Mohamed El-Erian, diretor gerente para mercados emergentes da Pimco, a maior administradora de fundos dos Estados Unidos. "O primeiro é a recente melhora das variáveis macroeconômicas, incluindo a forte posição balanço de pagamento, reservas altas e baixa vulnerabilidade da dívida", disse ele. "O segundo é o sentimento de que há amplo apoio na população e nos partidos pela manutenção da estabilidade financeira e o terceiro é o ambiente global benigno, caracterizado por ampla liquidez."

Segundo El-Erian, "o que a crise política fez foi adiar novas melhorias nos indicadores de risco que, de outra forma, seriam justificadas pelas condições econômicas e financeiras do país." O sucesso da operação de troca de US$ 4,4 bilhões de dívida com vencimento em 2014 por papéis mais longos, que o Banco Central concluiu na quinta-feira, mostrou que a crise política não afetou a confiança na política econômica.

Ao mesmo tempo, os analistas adotaram uma posição nitidamente mais cautelosa na semana passada, depois que o ex-tesoureiro do Partido dos Trabalhadores (PT), Delúbio Soares, apresentou à CPI a canhestra versão de que só ele sabia do caixa 2 petista. A declaração foi tomada como um indício de que, muito provavelmente, o oposto é verdadeiro e inspirou a seguinte nota enviada pelo Bear Stearns a seus clientes, na sexta-feira. "Desde que os detalhes do escândalo de corrupção começaram a emergir, chamamos atenção para um vínculo direto com o presidente (Lula) da Silva como o principal risco para a habilidade da administração de manejar de maneira efetiva a crise de uma maneira que isole, em grande medida, os mercados financeiros", informou o banco de investimento de Nova York.

"Vários eventos da última semana sugerem, no entanto, que a capacidade de (Lula) da Silva de administrar a crise de maneira efetiva poderá erodir-se nos próximos dias e semanas e que o risco de a crise política do Brasil começar a contaminar os preços dos ativos aumentou consideravelmente".