Título: CPI vai apertar cerco contra estatais para apurar tráfico de influência
Autor: Luciana Nunes leal
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/07/2005, Nacional, p. A11

Land Rover presenteada a petista e movimentação bancária de Marcos Valério despertaram parlamentares para investigações no setor

BRASÍLIA - A partir da próxima semana, a CPI dos Correios vai aprofundar as investigações das estatais para apurar principalmente os crimes de corrupção, tráfico de influência, fraude em concorrência e contra a ordem tributária. Dois fatos levaram à necessidade de intensificar a atuação da comissão nas empresas do governo: a comprovação de que o ex-dirigente do PT Silvio Pereira ganhou um carro de presente da empresa GDK, prestadora de serviços da Petrobrás, e os indícios de que a movimentação bancária das empresas do publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza ia além dos contratos de publicidade de suas agências. O senador Heráclito Fortes (PFL-PI) lembra que a CPI está avançando no destino dado às altas quantias que passaram pelas contas de Valério, mas ainda tem poucas informações sobre a forma como o dinheiro chegou até o empresário. "Sabemos mais sobre a saída dos recursos do que a entrada. Tudo indica que os saques foram muito mais altos do que o empréstimo feito por Marcos Valério a pedido do Delúbio Soares. Dinheiro não é coelho para render tanto. Temos de descobrir como chegou tanto dinheiro nas contas. E uma boa parte é verba pública", diz Fortes.

Além de ter usado suas empresas para fazer empréstimos e levantar recursos de caixa 2 (dinheiro não declarado) para o PT, Marcos Valério é suspeito de participar de um esquema de corrupção de parlamentares, distribuindo dinheiro vivo para deputados governistas. Em depoimento à Procuradoria Geral da República, Marcos Valério disse que fez os empréstimos a pedido do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, seu amigo. Delúbio deu a mesma versão ao Ministério Público e à CPI e assumiu toda a responsabilidade sobre a operação com caixa 2.

"A investigação das estatais é fundamental porque até agora não ficou claro se Marcos Valério fez operações ilícitas só nos contratos de publicidade ou se ele era um arrecadador de fundos para campanhas eleitorais, usando uma conexão entre estatais e empresas privadas. No caso do Silvio Pereira, ele recebeu um benefício econômico de uma empresa que mantinha contratos com o governo e é preciso saber por quê", diz o deputado petista José Eduardo Cardozo (SP).

Segundo Cardozo, no caso dos Correios, "é evidente que houve falcatruas em licitações", mas é preciso verificar o grau de influência de Marcos Valério em todas essas fraudes. Também começam a ser investigadas suspeitas de favorecimento de empresas no Instituto de Resseguros do Brasil (IRB) e na Infraero e uma suposta rede de desvio de dinheiro em Furnas.

A CPI ouviu depoimentos de ex-diretores e ex-presidentes dos Correios. Em meados de agosto, representantes de outras estatais deverão ser chamados.

Os três depoimentos marcados para as duas próximas semanas dificilmente avançarão na investigação sobre a chegada do dinheiro às contas. As revelações, se acontecerem, continuarão na linha dos saques milionários feitos das contas das empresas de Marcos Valério. Vão depor a mulher do empresário, Renilda Santiago Fernandes de Souza, além de Simone Vasconcelos, funcionária da SMPB, uma das agências de Valério, e o policial David Rodrigues Alves, que fez vários saques da conta da empresa no Banco Rural, somando R$ 4,9 milhões. Simone sacou o total de R$ 6,1 milhões.

Nas investigações das licitações públicas, o senador César Borges (PFL-BA) diz que é preciso investigar o grau de influência de Silvio Pereira e de Delúbio Soares nas concorrências. "Estamos encontrando uma série de mordomias que eles usufruíam com dinheiro das empresas, como vôos em aviões particulares. Favores como dar um carro de presente gera enriquecimento ilícito", diz o senador baiano.

"Se passou um carro, passou muito mais para financiar o projeto de poder", diz a deputada Denise Frossard (PPS-RJ). "Os crimes que estão aparecendo são corrupção, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro. Coisa pesada", acrescenta a juíza aposentada.

Na semana passada, a CPI decidiu enviar um ofício à empresa GDK Engenharia pedindo explicações sobre o "presente" dado a Silvio Pereira e sobre o contrato com a Petrobrás para adaptação da planta da plataforma P-34, no valor de US$ 88 milhões (cerca de R$ 265 milhões). Em nota, a Petrobrás informou que a GDK presta serviços à estatal desde 1994 e considerou "descabidas e infundadas" as suspeitas de favorecimento. O vice-presidente da GDK, César Roberto Santos Oliveira, disse na última quinta-feira que deu de presente a Silvio Pereira um jipe Land Rover, no valor de cerca de R$ 74 mil.