Título: Dólar na cueca era propina, diz PF
Autor: Fausto Macedo e Ribamar Oliveira
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/07/2005, Nacional, p. A9

A Polícia Federal e a CPI dos Correios suspeitam que o petista José Adalberto Vieira da Silva - preso em flagrante no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, dia 8, com US$ 100 mil na cueca e R$ 200 mil numa maleta - pode fazer parte de um esquema que supostamente favoreceu o consórcio STN (Sistema de Transmissão do Nordeste), integrado pelas empresas privadas Alusa e Cavan e pela estatal Companhia Hidrelétrica do Vale do São Francisco (Chesf). O consórcio foi escolhido para construir um linhão de transmissão de energia elétrica, também chamado de "linhão de 500 kv", que ligaria Teresina (PI) a Sobral (CE) e Fortaleza. O empreendimento foi parcialmente financiado pelo Banco do Nordeste (BNB). "É dinheiro de propina", acredita o delegado José Pinto de Luna, que conduz a investigação. Ele descobriu que Adalberto - ex-assessor do deputado José Nobre Guimarães, do PT cearense, irmão de Genoino - chegou a São Paulo um dia antes de ser preso para pegar o valor que teria sido pago por interessados num negócio de R$ 500 milhões.

Segundo rastreamento da PF, a última ligação feita por Adalberto, antes de ser flagrado em Congonhas, foi feita para José Petronilho de Freitas, diretor da Cavan. Adalberto ligou também para Kennedy Moura, que era assessor especial da presidência do BNB. Moura é amigo do deputado Guimarães.

O senador Heráclito Fortes (PFL-PI), que integra a CPI dos Correios, acha que a investigação sobre a escolha do consórcio pode levar ao ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares. "A aprovação dessa operação foi muito rápida", disse o senador. "A empresa Alusa é conhecida no Nordeste como a empresa de Delúbio", afirmou Fortes.

A PF descobriu que Moura esteve em São Paulo dois dias antes da prisão de Adalberto. Os federais apuram se o irmão de Genoino tinha conhecimento da operação. "Tudo indica que Adalberto era um emissário de Kennedy Moura", anotou o delegado Luna. "O Adalberto encontrou-se em São Paulo com José de Freitas." O petista hospedou-se no Quality Hotel.

Quando Adalberto foi capturado, o primeiro para quem ligou foi Moura. Os dois são amigos e militam no PT há 20 anos. Moura ligou para o consórcio, que providenciou um advogado para acompanhar o caso na PF. Ontem, a Alusa divulgou nota por meio da qual "nega e repudia, com indignação" a insinuação de que a empresa teria vínculo com Delúbio.

"Não é verdade que a empresa ou qualquer coligada tenha sido beneficiada ou favorecida pelo governo", diz. "Haja vista que o empreendimento foi colocado em disputa em setembro de 2003, na Bolsa de Valores de São Paulo, com a participação de inúmeros concorrentes. A licitação foi vencida pelo consórcio integrado pela Alusa, que ofereceu preço 39% abaixo do piso da Agência Nacional de Energia Elétrica."

'INVERDADES'

O Ministério Público Federal (MPF), no Ceará, também investiga a origem do dinheiro encontrado com Adalberto.

O procurador Márcio Torres disse ontem que o depoimento dele está repleto de "inverdades". O MPF apurou que, no dia 7 de julho, o petista chegou por volta das 11h17 em edifício comercial na Avenida Brigadeiro Faria Lima, 3.729, São Paulo, e se dirigiu ao 5.º andar, onde funciona a Regus Business Center, especializada em aluguel de escritórios virtuais.

"Muito provavelmente foi lá que ele recebeu o dinheiro", diz Torres.

O MPF está com a relação das pessoas que entraram neste edifício para saber se alguma delas teria relação com o dinheiro apreendido com Adalberto. De acordo com Torres, o ex-petista saiu da Regus às 11h27 e foi ao hotel onde ficou hospedado, bem próximo ao edifício, onde fez o check-in às 11h45.

O MPF também está investigando o contrato de empréstimo com o Banco do Nordeste com o Sistema de Transmissão Nordeste (STN).

"No documento apreendido com ele (Adalberto) havia referências ao senhor José de Freitas, diretor da Cavan, e o número do telefone dessa empresa também estava lá anotado", diz Márcio Torres.

O procurador enviou ofício ao Banco do Nordeste (BNB) solicitando mais informações sobre o empréstimo feito à STN.

No depoimento prestado por Adalberto na última terça-feira ao MPF, ele confirma que esteve com o empresário José de Freitas. "Disse que foi fazer uma visita e conversaram amenidades, nada a ver com o dinheiro", informou Torres.