Título: Só 42% dos projetos saem do papel
Autor: Marcelo Rehder
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/06/2005, Economia & Negócios, p. B1

Com medo de que juros e câmbio comprometam crescimento, empresários revêem decisão de investimento, mostra pesquisa

Mais da metade dos planos de investimentos anunciados pelas empresas no segundo semestre de 2004 nem sequer saiu do papel. Pesquisa da consultoria MB Associados revela que só 42,1% dos projetos estão em andamento. A maioria dos demais está sendo revista ou adiada - resultado da incerteza em relação à sustentabilidade do crescimento econômico, provocada pelos juros altos e a persistente valorização do real ante o dólar. Nas últimas semanas, a insegurança dos empresários em investir cresceu muito, acompanhando o ritmo das denúncias de corrupção. "Não podemos deixar o ambiente político poluir todo o ar", alerta Paulo Skaf, presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). "Se não tivéssemos crise política, a teimosia do governo em insistir no binômio juro alto e câmbio baixo já seria suficiente para travar os investimentos, desaquecer a economia e até levar à recessão."

Para saber em que pé estão os projetos, a MB Associados partiu de um estudo do Ministério do Desenvolvimento sobre anúncios de investimentos. No segundo semestre de 2004, foram anunciados 601 projetos, que somavam US$ 54,2 bilhões, 4% menos que no semestre anterior (US$ 56,5 bilhões).

"Conversamos com as empresas e constatamos que 42,1% dos projetos estão em andamento, mas um alto porcentual está ainda em fase de elaboração e, dependendo do comportamento da política monetária e da situação política poderão, eventualmente, não sair do papel este ano", diz a economista Tereza Maria Fernandez Dias da Silva, diretora da MB Associados.

Um caso concreto é o da Grendene, uma das maiores produtoras de calçados sintéticos do País, com projeto de R$ 35 milhões para erguer uma fábrica em Teixeira de Freitas (BA), destinada a ampliar em 10% a capacidade de produção, hoje de 150 milhões de pares por ano. Mas a empresa não pretende desembolsar esse dinheiro a curto prazo. "A decisão estratégica está tomada, mas ainda não foi definido quando vamos tirar o dinheiro do caixa, que está rendendo esse CDI (Certificado de Depósito Interbancário) gordo de 20% ao ano, para pôr em tijolo de fábrica", diz Marcus Peixoto, diretor-financeiro. "É uma decisão tática que depende do comportamento do mercado, que está um horror."

A indústria de equipamentos B.Grob, de São Bernardo do Campo (SP), decidiu não gastar nada com investimento este ano. "Fomos apanhados de calças curtas", conta o presidente da Grob, Klaus Heydebreck, referindo-se à taxa cambial.

A empresa, que fabrica bens de capital cujo prazo de entrega é de um ano, em média, está terminando de entregar equipamentos de US$ 16 milhões para a General Motors do México. Quando o contrato foi fechado, em meados de 2004, o dólar estava cotada a cerca de R$ 3 - sexta-feira, estava em R$ 2,38. "Vamos fechar o ano no vermelho, porque não temos essa reserva de lucro."

A Braspelco, uma das maiores exportadoras de couro, tem projetos de US$ 40 milhões para agregar na exportação de capas de sofá e banco de carros que ainda não saíram do papel. "As razões passam pelo câmbio desfavorável e pelo elevado custo de capital e terminam no governo, que deixa de cumprir a lei ao não restituir créditos tributários", diz Arnaldo Piso Filho, presidente da empresa .