Título: Abbott terá de repassar dados sobre Kaletra
Autor: Lígia Formenti
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/06/2005, Vida&, p. A25

BRASÍLIA - O ex-coordenador do Programa Nacional de DST-Aids Alexandre Grangeiro descartou a possibilidade de que a quebra de patente do Kaletra possa trazer prejuízo para pacientes que usam o coquetel antiaids. Anteontem, o Brasil declarou interesse público pelo remédio, produzido pelo laboratório Abbott. A medida abre caminho para a quebra de patente e, com isso, possibilita a produção do remédio por Farmanguinhos, do Rio. Numa nota divulgada anteontem, o Abbott questionou, de forma indireta, a capacidade de o País produzir o medicamento com boa qualidade. "Mas esta responsabilidade é também da própria indústria", disse Grangeiro. Pela lei brasileira, com a quebra de patente, o Abbott terá de passar todas as informações sobre produção e tecnologia do Kaletra para o novo fabricante. Caso isso não seja feito, o governo poderá deixar de pagar os royalties. "Se o Abbott cumprir a legislação, não há perigo de o remédio ter qualidade inferior", disse.

O ministro da Saúde, Humberto Costa, afirmou ontem que a decisão da quebra de patente do Kaletra já está tomada. "A declaração de interesse público foi uma mera formalidade." A licença compulsória só deixará de ocorrer se a empresa concordar em pagar o preço estipulado pelo governo, de US$ 0,68 por unidade, num prazo de dez dias.

Grangeiro, que deixou o cargo justamente por discordar da demora do governo em quebrar a patente de anti-retrovirais, elogiou a decisão anunciada anteontem. "A medida é importante não só pela economia gerada. Ela certamente vai gerar também um incentivo à produção nacional de medicamentos."

Uma vez iniciada a produção, o País pagaria royalties de 3% para a Abbott. O valor é calculado sob o preço do medicamento produzido pela indústria. Esse processo, no entanto, começaria só em 2006. Até lá, a fábrica de Farmanguinhos faria os ajustes finais e testes para início da produção. E o mercado interno continuará a ser abastecido pelo Abbott. O contrato entre Brasil e o laboratório prevê o fornecimento até maio.

A quebra da patente do Kaletra é o desfecho de um processo iniciado há três meses. Preocupado com o alto custo de três remédios antiaids, o governo enviou carta a três fabricantes questionando o interesse da licença voluntária. O Abbott não quis negociar. "As negociações com a Merck e a Gillead estão em fase final. Se não houver consenso, não hesitaremos também em recorrer à licença compulsória", reafirmou Costa.