Título: Fisiologismo abalou o PT e o governo Lula, diz Suplicy
Autor: Guilherme Evelin
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/06/2005, Nacional, p. A14

Senador Eduardo Suplicy critica o governo por adotar a relação fisiológica como forma de ampliar sua base de sustentação

BRASÍLIA - Eduardo Suplicy (SP) foi o único senador do PT que assinou o requerimento de criação da CPI dos Correios. Foi chamado de oportunista pelos colegas de bancada e desligado da chapa do campo majoritário, a corrente dominante no PT, que concorre à direção nacional do partido em setembro. Depois das denúncias do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) sobre o mensalão, enquanto a cúpula do PT corria para apoiar a CPI no afã de tentar diminuir o prejuízo, Suplicy recolhia aplausos - expressos nos e-mails que lotam a caixa de seu correio eletrônico e exibidos por ele com orgulho. "Foi um grave erro de avaliação da cúpula do partido." Hoje, Suplicy faz plenária para ouvir os militantes do partido se deverá concorrer em 2006 ao terceiro mandato de senador. Apesar da má vontade da cúpula do PT, 99% dos freqüentadores de sua página na internet responderam que sim. Na quinta-feira, Suplicy recebeu o Estado para entrevista.

O senhor participou da audiência no Congresso em que líderes do MST, CUT denunciaram tentativa de desestabilização do governo. Também aderiu à tese de que há golpismo nas denúncias do mensalão?

Solicitei ao presidente do Senado, Renan Calheiros, a audiência em que mais de 40 entidades entregaram a "Carta ao Povo Brasileiro". Nesse documento, procuraram enfatizar que haveria movimento para tentar desmoralizar o governo Lula e desestabilizá-lo, mas expressaram também a importância de se apurar inteiramente todos os atos de corrupção e de se dar continuidade ao processo democrático. É importante essa manifestação em defesa das instituições, mas as denúncias são muito sérias. Elas nos entristeceram e mexeram fortemente com o brio das bases do PT.

O sr. acha então que a tese de golpismo é falsa?

Se levarmos em consideração as palavras dos principais líderes do PSDB e do PFL, todos têm feito questão de ressaltar que o presidente deve completar seu mandato. Em alguns momentos, notam-se atitudes de radicalização das críticas, mas não observo nas principais forças de oposição a defesa de golpe. Não há propósito de promover o Fora, Lula.

Qual é o crédito que o sr. dá às denúncias de Jefferson sobre mensalão?

Há certas inconsistências na denúncia de Jefferson. Sobre a origem do mensalão, ele já deu três versões diferentes. Disse que teria surgido na Assembléia do Rio, por iniciativa do deputado Bispo Rodrigues. Depois, declarou que era algo apenas no âmbito do PL e PP e não do PT. No Roda Viva, mudou outra vez e disse que o mentor seria o ex-ministro José Dirceu. Mas acho que a denúncia deu um salto de credibilidade com o testemunho da deputada Raquel Teixeira. Muito dificilmente uma pessoa com a responsabilidade de ser secretária de Estado relataria, com aqueles detalhes, oferta de contribuição ou de benefício pessoal, que, nitidamente, afronta a Constituição. Este episódio não confirma, até agora, a responsabilidade do PT ou do Planalto no mensalão, mas reforça a importância de ir fundo na apuração dos fatos.

Mas o PT resistiu o quanto pôde a ir a essa investigação. O senhor, por exemplo, foi tachado de oportunista por ter apoiado a CPI.

Foi um grave erro de avaliação da cúpula do partido. Nunca na história houve distanciamento tão grande entre o que pensavam os dirigentes nacionais e as bases do partido. Nas bases, sempre houve desejo forte de apuração em profundidade.

Há forma de o PT ainda conseguir dar a volta por cima?

Uma providência o presidente Lula já tomou ao apoiar as investigações do Congresso. E espero que ele passe a dizer com muito mais clareza qual procedimento espera ter na relação com o Congresso . Ele deu um bom sinal ao indicar Dilma Rousseff. É de conhecimento público que ela, em algumas ocasiões, negou-se a aceitar indicações políticas, para resguardar as organizações do Ministério de Minas e Energia.

Mas não foi o próprio governo do PT, sob o comando do ex-ministro Dirceu, que acentuou essa relação fisiológica com a base?

Essa prática vem de muito temp. Tive consciência de que nós do PT iríamos ter um procedimento diferente. Percebi nesses 30 meses, na convivência com os senadores, que o governo, para ter apoio de mais partidos, adotou, em alguns casos, também essa prática. Isso contribuiu para o presente terremoto no PT e no governo. O importante é que o presidente Lula coloque em prática as diretrizes anunciadas na quinta-feira, quando conclamou a colocarmos o interesse nacional acima dos particulares.