Título: O que faz a USP ser a 1.ª em produção científica
Autor: Herton Escobar
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/07/2005, Vida&, p. A18

Os novos dados sobre o aumento da produção científica no Brasil, divulgados nesta semana pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior (Capes), trazem de volta o debate sobre a qualidade e a importância das pesquisas feitas no País. Segundo o relatório, a produção brasileira cresceu 15% em 2004. Cientistas garantem que o aumento não foi apenas quantitativo - referente ao número de trabalhos publicados -, mas qualitativo. No topo dessa cadeia produtiva intelectual está a Universidade de São Paulo (USP), de longe a instituição que mais produz conhecimento no Brasil. Entre 1998 e 2002, a USP foi responsável por 26% das publicações científicas brasileiras, segundo os Indicadores de Ciência, Tecnologia e Inovação da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), divulgados também recentemente. A Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), segunda colocada, teve participação de 11%.

Para o pró-reitor de Pesquisa da USP, Luiz Nunes de Oliveira, a liderança é reflexo do investimento feito em pós-graduação desde a década de 70. "Antes disso, a USP tinha um sistema de pesquisa muito forte, mas ele não crescia e dependia de talentos extraordinários para obter resultados", diz. "A pós-graduação deu origem a um sistema auto-sustentável: uma vez formados, os doutorandos queriam orientar e, como cada orientador trabalha com mais de um aluno, o sistema cresce, da mesma forma que cresce uma população na qual cada casal tem mais de dois filhos."

Hoje, o quadro de pesquisa da universidade é formado por cerca de 5 mil professores doutores, mais 25 mil alunos de mestrado e doutorado.

Outro fator importante, segundo Oliveira, é o suporte da Fapesp, que financia sistematicamente boa parte do projetos científicos da instituição.

"A USP tem uma estabilidade que permite ao pesquisador trabalhar com mais tranqüilidade, produzir mais e melhor", avalia a astrônoma Beatriz Barbuy, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG). Há 23 anos na USP e com 150 artigos no currículo, ela é uma das pesquisadoras que mais publicam no Brasil.

QUALIDADE

Como regra geral, um trabalho científico só é reconhecido a partir da publicação em um periódico indexado, no qual sua veracidade é confirmada por outros pesquisadores. Os indicadores da Capes e da Fapesp têm como base o banco de dados americano ISI, que reúne as principais revistas científicas do mundo. "São publicações que já fazem uma preleção extremamente rigorosa dos trabalhos", diz o professor José Gregolin, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), um dos autores dos indicadores da Fapesp. "O fato de estarem nessa base de dados já garante que são bons trabalhos."

Outra forma de aferir a importância de um estudo é rastrear o número de vezes que ele é citado por outros pesquisadores. Entre 1994 e 1999 (os dados mais recentes compilados pela Fapesp), o número de citações de trabalhos brasileiros dobrou, passando de 0,2% para 0,4% de participação no cenário internacional. "Parece pouco, mas é um avanço significativo para a realidade do Brasil", avalia Gregolin. "Temos todas as razões para afirmar que o crescimento quantitativo está acompanhado de um forte crescimento qualitativo", diz o diretor científico da Fapesp e ex-reitor da Unicamp, Carlos Henrique de Brito Cruz.

O professor emérito Sérgio Ferreira, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP, faz uma avaliação mais crítica da situação. Ele contesta a qualidade de certas revistas científicas. "Tem muita porcaria indexada", diz. "Se um trabalho não está indexado, significa que é muito ruim. Mas, se está indexado, isso não quer dizer muita coisa." De seus 250 trabalhos publicados, ele diz que só 20 foram realmente importantes. "O resto foi só para provar que não sou burro ou para mostrar que os outros 20 eram importantes."