Título: Amanhã, Dirceu enfrenta Jefferson
Autor: Guilherme Evelin, Christiane Samarco e Gilse Guede
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/08/2005, Nacional, p. A5

O ex-ministro José Dirceu foi orientado a ser agressivo e a encarar, olho no olho, o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) no duelo de amanhã no Conselho de Ética da Câmara. Foi aconselhado também a usar gestos fortes, como dedo em riste, para desqualificar o oponente e caracterizá-lo como mentiroso. Desde a semana passada, esse repertório está sendo ensaiado pelo ex-todo-poderoso chefe da Casa Civil em repetidas sessões de preparação para acareação com Jefferson, considerada crucial para a sua sorte política. Apesar de Dirceu sustentar que não serão encontradas provas de seu envolvimento com o suposto esquema do mensalão no Congresso, seus assessores temem que um vacilo diante de Jefferson comprometa sua linha de defesa. "Ele será assertivo e não deixará nenhuma pergunta sem resposta", garante o advogado criminalista José Luís Oliveira Lima, um dos três responsáveis pelo apronto final de Dirceu para o vale-tudo com Jefferson.

O ex-ministro está sendo orientado também por dois especialistas em questões eleitorais: Fernando Neves, ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e José Antônio Toffoli, seu assessor para assuntos jurídicos na Casa Civil.

Um desempenho convincente diante do ex-presidente do PTB é encarado pelo ex-ministro como decisivo até para o futuro do governo Lula e do PT. "É bom que ele (Jefferson) apareça para evitar acusações de um acordo. Tenho certeza de que, se eu me sair bem, essa crise vai estancar por aqui", disse Dirceu a interlocutores nos últimos dias. Uma das providências tomadas foi fazer um levantamento minucioso da agenda de dois anos e meio como chefe da Casa Civil para dar explicações sobre o relacionamento com Marcos Valério Fernandes de Souza e a sua participação nos empréstimos tomados pelo empresário mineiro em favor do PT.

A agenda no Planalto se tornou peça importante porque Dirceu atribuirá toda a responsabilidade pelas operações financeiras do PT, via caixa 2, ao ex-tesoureiro Delúbio Soares. Sua presença na coordenação política e administrativa do governo servirá como álibi para alegar desconhecimento da vida financeira e contábil do partido e da existência dos empréstimos. Uma coisa é o governo, outra é o PT, alegará.

Apesar de aconselhado a agir com agressividade com relação a Jefferson, o ex- ministro recebeu recomendações a moderar o tom com os demais inquisidores do Conselho de Ética, mesmo os da oposição. Ele não resistirá a falar sobre o caixa 2 operado por Marcos Valério para os tucanos mineiros em 1998, mas deverá ser só como revide a perguntas encaradas como provocação.

ABANDONO

Desamparado pelo Palácio do Planalto, como ele mesmo tem dito a amigos, Dirceu deverá ser entregue à própria sorte em seu depoimento. O Palácio não vai interferir nos trabalhos do Conselho de Ética nem tampouco tem qualquer estratégia para ajudar na defesa do petista.

Integrantes do conselho avaliam que está em jogo no depoimento o mandato de Dirceu e, para se salvar, o ex-chefe da Casa Civil poderá expor ainda mais o governo. Ele vai depor como testemunha em processo que apura a quebra de decoro parlamentar de Jefferson, que já avisou estará na primeira fila.