Título: Derrota no BID mostra que o País está isolado
Autor: Denise Chrispim Marin e Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/08/2005, Nacional, p. A8

A derrota do Brasil na eleição para a presidência do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), na quarta-feira passada, pôs em xeque a eficácia da "audaciosa e agressiva" política externa do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Os últimos fracassos mostram o isolamento cada vez maior do Brasil em relação a seus vizinhos latino-americanos. Deixam evidente também que o empenho em afinar as relações com o mundo em desenvolvimento pouco serve para ampliar a influência do País nos círculos de poder mundial. Em maio, já fracassara a candidatura do embaixador Luiz Felipe de Seixas Corrêa à direção-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC).

Para completar o quadro, um dos diretores-adjuntos da entidade será o brasileiro Victor do Prado, diplomata que se distanciou do Itamaraty e que não foi indicado pelo governo Lula. Na semana passada, a história foi parecida. Deu errado a campanha do economista João Sayad à presidência do BID. O vencedor foi o colombiano Luiz Alberto Moreno, candidato apoiado pelos Estados Unidos, e Sayad, que é vice-presidente do banco para Finanças e Administração, ainda corre o risco de perder o posto.

A próxima ameaça no horizonte é contra o mais ambicionado objetivo da política externa brasileira: a conquista de um assento permanente no Conselho de Segurança das Organização das Nações Unidas (ONU). O professor Celso Lafer, chanceler durante o governo Fernando Henrique Cardoso, avalia que a crise política interna pode prejudicar os planos do Itamaraty. "O ativo do governo, que era a novidade e a originalidade do presidente Lula e o significado do PT, sofreu um deságio brutal", diz.

BOBAGEM

"A isso se somam o excesso de autoconfiança, que levou a área externa a vários enganos, e a proclamação da liderança do Brasil na América do Sul, que gerou tensões na nossa vizinhança." Em diplomacia, falar bobagem significa fazer bobagem e o presidente Lula nunca perdeu a chance de repetir que o Brasil "é o líder" da América do Sul. Foi além: chegou a declarar que os países vizinhos "querem a nossa liderança".

Na época, o ex-chanceler Luiz Felipe Lampreia advertiu: "Liderança não se proclama. Quem tem a exerce." O fato é que, desde então, o Mercosul se enfraqueceu e as investidas do Brasil em outras esferas internacionais passaram a ser sistematicamente boicotadas pelos vizinhos.

Nenhum país latino-americano, com exceção do Panamá, votou em Seixas Corrêa. Dos nove vizinhos sul-americanos sócios do BID, Sayad obteve os votos apenas de quatro. Desses, somente a Argentina era sócia do Mercosul. Na campanha pela cadeira permanente no Conselho de Segurança, a trinca Argentina-Colômbia-México compõe o grupo de resistência.

JOVEM EXIBIDO

O governo dos Estados Unidos postou-se diante da liderança do presidente Lula na América do Sul como um adulto abordado por jovens que se vangloriam de suas qualidades. Washington não hostilizou, mas tampouco prestou atenção nas atitudes de Brasília.

O governo Bush somente sublinhou as ações brasileiras que considerava positivas e, portanto, atendiam aos seus interesses. Uma delas foi o comando do Brasil na missão de estabilização da ONU no Haiti.

Os Estados Unidos já haviam testado os limites da liderança regional do governo petista no capítulo das negociações comerciais. Em outubro de 2003, o Mercosul dividiu-se durante uma reunião vice-ministerial da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), em Trinidad y Tobago, e o Brasil terminou isolado.