Título: Debate na OMC fica para setembro
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/07/2005, Economia & Negócios, p. B6

O Brasil dá por concluída por enquanto as negociações sobre a liberalização dos mercados agrícolas na Organização Mundial do Comércio (OMC). Os 148 países membros da entidade tinham até sexta-feira para fechar um entendimento que pudesse aproximar as posições dos governos em temas como subsídios domésticos, apoio à exportação e tarifas de importação. "A semana para mim já acabou", afirmou o embaixador Clodoaldo Hugueney, subsecretário de Assuntos Econômicos do Itamaraty e que lidera a delegação brasileira. Ele informou que a participação do chanceler Celso Amorim nos debates em Genebra, prevista para os próximos dias, já foi cancelada. A própria OMC reconheceu ontem que não haveria como chegar a um acordo até o fim da semana e os reais debates serão relançados em setembro. O prazo havia sido estabelecido por ministros, incluindo Amorim, no início do ano. O objetivo era fechar entendimentos sobre os parâmetros dos cortes de tarifas e de subsídios para que, em dezembro, a conferência da OMC de Hong Kong definisse o rítmo de liberalização nos setores agrícolas e industriais. Sem acordo, a especialista da Oxfam (organização mundial de combate à pobreza), Celine Charveriat, teme novo fracasso em Hong Kong, como ocorreu em Cancún há dois anos.

Segundo Hugueney, o Brasil e o G-20 (bloco de países emergentes) "fizeram o que podiam para encontrar um acordo". Para ele, porém, parece não ter chegado ainda o momento para que países tomem decisões que admite ser "difíceis". Uma delas refere-se à abertura dos mercados agrícolas. O G-20 apresentou há duas semana uma proposta de que todas as tarifas de importação fossem limitadas a 100% aos países ricos. Hoje, certas tarifas do Japão, por exemplo, atingem 700%. A proposta do Brasil ainda inclui a divisão das demais tarifas abaixo de 100% em cinco categorias.

A Europa sugeriu mudanças, entre elas o fim do teto de 150%. Mas se recusou a pôr no papel a nova proposta e o G-20 não aprovou a atitude de Bruxelas. Os europeus alegam que não quiseram criar um confronto com a proposta do Brasil. "Há muita dificuldade em abrir mercados", admitiu Hugueney.

Quanto aos subsídios domésticos, o único entendimento era de que os países ricos seriam divididos em três categorias. No topo, os europeus seriam os que mais precisariam cortar subsídios. Em segundo lugar, americanos e japoneses. Na terceira faixa entrariam os demais países ricos. Mas, para o Brasil, esse princípio de entendimento não é suficiente, já que não há nenhuma indicação desses países de quanto poderiam cortar.

O Brasil acredita que para dar algum significado real às exportações nacionais, os americanos teriam de reduzir subsídios domésticos em até 70%. Na Europa, o corte ficaria entre 75% e 80%. Já o Japão superaria essa marca.

No capítulo dos subsídios à exportação, os governos ainda não conseguiram chegar a um entendimento sobre qual deve ser a data para eliminar esse mecanismo. Os chineses e americanos, por exemplo, falam em 2010.

Sem um acordo agrícola nesta semana, os negociadores brasileiros não esconderam que não poderão fazer nenhuma concessão na liberalização de seu mercado para produtos industriais. "Estávamos dispostos a mostrar flexibilidade, mas não podemos se não há nenhum avanço no setor agrícola", afirmou Hugueney.

Para muitos negociadores, entre eles os argentinos, a culpa da falta de acordo é dos EUA e da Europa, que não conseguiram um entendimento. De um lado, a UE recusou-se a apresentar uma proposta formal de corte em suas tarifas enquanto os americanos não indicassem quanto poderiam cortar de seus subsídios domésticos. Washington, paralisado por ter de conseguir a aprovação nesta semana do acordo de livre comércio com a América Central no Congresso, também não foi capaz de fazer nenhuma concessão.