Título: Lula vê mandato em risco e recorre às bases em busca de blindagem
Autor: Vera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/07/2005, Nacional, p. A4

Como desgaste do governo e do presidente já se reflete nas pesquisas, PT avalia que oposição pode passar a defender impeachment

Abalado com a crise política, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai repetir a estratégia que pôs em curso no fim de semana: de agora em diante, recorrerá ao contato com a população para salvar o seu governo e evitar que haja tentativa de impeachment. A interlocutores com quem conversou nos últimos dias, o presidente demonstrou profundo abatimento. ¿Veja o que fizeram com o meu governo¿, disse Lula a um ministro que viajou com ele recentemente, numa referência à crise provocada depois das denúncias de que o PT pagava mesada a deputados da base aliada em troca de apoio. Emocionado, chegou a chorar.

A preocupação é grande porque o descontentamento com o governo já começa a atingir a imagem do presidente, como indicam as pesquisas. Em busca de apoio, Lula começou a cumprir uma agenda mais popular. Na sexta-feira, almoçou no bandejão da Refinaria Duque de Caxias (RJ), onde anunciou que não vai ¿abaixar a cabeça¿ para as elites; no sábado, retornou a São Bernardo, seu berço político, onde comeu frango com polenta com velhos amigos sindicalistas. Ontem ele esteve na festa dos cegonheiros e hoje fará inspeção no canteiro de obras do Aeroporto de Brasília, seguida de café com operários.

COMITÊ

A agenda popular ganhará reforço em agosto. Além disso, o PT pedirá ajuda aos movimentos sociais: pretende incentivá-los a criar um comitê em defesa do mandato de Lula. Em reunião no sábado, em São Paulo, o Campo Majoritário ¿ grupo que reúne quase 60% dos cargos de direção do partido ¿ fez um diagnóstico bombástico: o País mergulhará em grave confronto político, nos moldes da Venezuela, se a oposição pedir o impeachment do presidente.

Dirigentes do Movimento dos Sem-Terra (MST), de sindicatos da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e representantes de movimentos populares já avisaram Lula e o PT que estão dispostos a sair às ruas para impedir o que chamam de ¿golpe¿.

¿Nós não temos a tutela dos movimentos sociais, mas, se houver uma articulação para o impeachment, é óbvio que todos faremos a defesa do presidente¿, afirmou o presidente do PT, Tarso Genro. Ao longo de agosto Tarso vai se reunir com representantes dos movimentos sociais, intelectuais, sindicalistas e empresários. ¿Queremos restabelecer o diálogo com todos os setores¿, disse.

¿Passada a fase de estupefação, é hora de defender o patrimônio de realizações de um governo que estabilizou a economia e já gerou 3 milhões de emprego¿, argumentou o secretário-geral do partido, deputado Ricardo Berzoini (SP). ¿Não podemos permitir que a crise política tome conta de tudo e seja a única pauta.¿

A portas fechadas, o deputado José Dirceu (SP), ex-chefe da Casa Civil, admitiu estar preocupado com o depoimento à CPI dos Correios de Renilda Fernandes, mulher do publicitário Marcos Valério ¿ apontado por Roberto Jefferson (PTB-RJ) como operador do mensalão ¿, marcado para amanhã.

Aos companheiros Dirceu insistiu não ter feito nada de irregular no governo e no PT. Adotou, porém, a retórica de que há uma ¿conspiração das elites¿ para derrubar Lula. Esboçando indignação, pregou ¿reação mais enérgica¿ por parte do PT para defender o presidente. ¿Que ninguém pense que vai se salvar sozinho.¿ Para ele, o governo precisa ¿fazer a disputa política¿ e partir para o confronto com a oposição.