Título: UE não admite fim das negociações
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/07/2005, Economia & Negócios, p. B6

Numa tentativa, considerada por muitos delegados como encenação, europeus tentam culpar americanos por fracasso na OMC

A Europa monta uma estratégia para transferir para os Estados Unidos a responsabilidade pelo fracasso das negociações na Organização Mundial do Comércio (OMC). Os 148 países da entidade deveriam fechar um acordo nesta semana sobre a abertura dos mercados, mas a falta de entendimento em áreas como subsídios e cortes tarifários impediu qualquer avanço e agora já há quem tema um novo fiasco na conferência ministerial em Hong Kong. Na terça-feira, o governo brasileiro já havia declarado que dava por encerradas as negociações agrícolas desta fase e o processo seria retomado só em setembro. Os europeus, em uma iniciativa considerada encenação por outras delegações, afirmam que o processo não foi concluído. "Não abandonaremos antes do fim do processo", afirmou um alto negociador europeu. Bruxelas decidiu enviar hoje seu comissário de Comércio, Peter Mandelson, para a reunião de Genebra. Muitos delegados, incluindo os brasileiros, questionam o motivo da viagem.

O Brasil não aceitou entrar no jogo de Bruxelas e, mesmo com a ida de Mandelson à reunião de hoje, o Itamaraty não estará representado pelo ministro Celso Amorim. A idéia do Brasil é garantir que, para setembro, os debates sejam retomados com a proposta do G-20 sobre o corte de tarifas agrícolas no centro do debate.

Já os europeus ainda querem deixar claro que não podem ser responsabilizados pelo novo fracasso das negociações. Além de mandarem Mandelson a Genebra, fazem questão de insistir que a proposta do G-20 sobre tarifas agrícolas é "boa" e podem aceitá-la como base.

Com isso, analistas apontam que estão transferindo a responsabilidade pelo fracasso para os Estados Unidos, que nos últimos dias não deu nenhum sinal de flexibilizar sua posição.

Washington espera a aprovação de seu acordo comercial com a América Central no congresso americano e, por isso, não pode neste momento fazer nenhuma nova concessão na OMC.

O Brasil vê com suspeitas os amplos elogios europeus à sua proposta. Isso porque, há poucos dias, Bruxelas se recusou a colocar uma contraproposta sobre a mesa e apenas se dedicou a desconstruir as idéias do G-20 de impor uma tarifa máxima de 150% para produtos agrícolas.

Ainda que a OMC esteja esvaziada, ativistas continuam garantindo que vão promover manifestações nos portões da entidade hoje e amanhã.

Em um cenário esquizofrênico, jornalistas de vários países chegavam a Genebra para cobrir o evento que acabará não ocorrendo. Dezenas de policiais fortemente armados ainda fazem a segurança do prédio da OMC, onde não se encontra praticamente nenhum dos grandes xerifes do comércio mundial.