Título: O Brasil diante do Cafta
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Fonte: O Estado de São Paulo, 30/07/2005, Nacional, p. A3

Com a aprovação do Acordo de Livre Comércio da América Central (Cafta) pelo Congresso americano, mais seis países ganham acesso facilitado ao maior mercado consumidor do mundo ¿ os Estados Unidos. É esse o aspecto mais importante desse acordo para o Brasil. Costa Rica, República Dominicana, El Salvador, Guatemala, Honduras e Nicarágua passam a ter uma vantagem para atrair investimentos e para competir comercialmente com os de fora do clube. O Brasil é um dos países de fora e a sua situação tende a piorar. Canadá e México têm assegurado o acesso ao mercado americano, como sócios do Nafta, o Acordo de Livre Comércio da América do Norte. O Chile entrou no clube e três outros sul-americanos ¿ Colômbia, Equador e Peru ¿ estão negociando o ingresso.

De todos esses mercados, apenas Canadá e México têm grande importância para os EUA. O potencial de compra da maior parte é muito menor que o do Brasil. Em cada uma dessas manobras, no entanto, aumenta o isolamento dos países do Mercosul. Outros países da região, a começar por Chile e México, têm sido muito mais velozes na busca de parcerias comerciais com os mercados mais importantes.

Acordos de comércio alteram as condições de competição pelo menos de duas formas. Primeiro, criam melhores condições de acesso a mercados para as empresas de cada país participante. Em segundo lugar, essas facilidades atraem capitais. Empresários americanos, por exemplo, normalmente investem nos países que têm acordos comerciais com os EUA. Isso ocorre de modo especial quando se pode transferir para esses países, com vantagens de custo, pelo menos parte da produção.

Isso já tem ocorrido em relação à América Central e ao Caribe e a tendência poderá intensificar-se. Um acordo com os andinos ampliará as oportunidades de investimento para os empresários dos EUA e também de outros países. A grande atração será produzir a custo reduzido para vender sem restrição ou com menores barreiras ao maior dos mercados consumidores.

Quando se constrói ou se amplia uma indústria num desses países, para vender a um grande mercado, aumenta a concorrência com as indústrias que operam no Brasil. A desvantagem, portanto, decorre tanto do maior acesso concedido às empresas de alguns países como do investimento atraído pelas novas condições.

Mas o custo para o Brasil não termina aí. Diante da vantagem criada pelos acordos, empresários brasileiros também estão sendo atraídos. Alguns industriais já revelaram a disposição de investir em países do Cafta ou da região andina, para aproveitar as vantagens de acesso ao mercado americano.

Em todo o mundo os grandes grupos empresariais tendem a internacionalizar-se, mas, nesse caso, há motivos para se lamentar a novidade. Empresários planejam investir fora do Brasil para superar desvantagens que seriam perfeitamente evitáveis com políticas mais sensatas. A tributação excessiva é uma delas. Mas, a mais importante, neste momento, é a desvantagem brasileira diante da reordenação dos mercados. Enquanto outros governos buscam acordos com ousadia para ampliar o comércio, atrair capitais e criar oportunidades de negócios, o do Brasil se aferra a uma diplomacia comercial orientada por bandeiras terceiro-mundistas. Resultado: nada comparável aos acordos de livre comércio concretizados por outros países.

O grande aumento das exportações nos últimos anos foi obtido principalmente pelo esforço dos empresários, que vêm ganhando eficiência produtiva e comercial e buscando no mercado externo o caminho para ampliação de seus negócios.

A abertura de novos mercados, incluído o chinês, é trabalho iniciado há vários anos e mantido neste governo, agora com outra coloração ideológica. O Mercosul está emperrado. A negociação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca) está emperrada, assim como a Rodada Doha. Diante desses impasses, os demais países das Américas tentam realizar os acordos possíveis. Nesse quadro, o Brasil é a exceção mais impressionante por sua lentidão.