Título: 'A coisa está ruim', admite José Alencar
Autor: Leonencio Nossa e Gilse Guedes
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/08/2005, Nacional, p. A9

O vice-presidente e ministro da Defesa, José Alencar, estava em Belo Horizonte no momento em que Valdemar Costa Neto (PL-SP) renunciava, no plenário da Câmara, ao mandato de deputado. Presidente de honra do Partido Liberal, Alencar evitou se pronunciar sobre a decisão tomada pelo colega de legenda e um dos parlamentares mais assíduos no gabinete da Vice-Presidência nos últimos dois anos e meio. A amigos, o vice-presidente demonstra estar atônito diante de tantas denúncias. "A coisa está ruim. Está tudo esquisito. Até a vaca está estranhando o bezerro", disse Alencar a uma pessoa próxima ao saber da renúncia.

Em encontro reservado ocorrido no sábado, em Belo Horizonte, Costa Neto informou a Alencar que iria renunciar, segundo um parlamentar do partido. Alencar, segundo relato de um parlamentar do PL, ficou preocupado com a repercussão do gesto e perguntou: "Não tem outra saída?" Costa Neto foi lacônico: "Não".

Valdemar Costa Neto viajou à capital mineira especialmente para comunicar a Alencar a decisão de sair da Câmara antes da abertura de um processo de quebra de decoro parlamentar no Conselho de Ética da Casa. Ele argumento, na conversa com o vice-presidente, que renunciando não perderia os direitos políticos e poderia concorrer novamente ao cargo de deputado na eleição de 2006. Também disse que convocaria os deputados do partido a um encontro em Brasília. Alencar teria ficado perplexo com a decisão de Costa Neto.

Desde o início da onda de acusações que atingiu o governo e a base aliada, Alencar vem fugindo dos holofotes. O PL é um dos partidos de sustentação do Planalto acusados de receber mensalão.

Em conversas reservadas, o vice-presidente avaliou que Costa Neto foi "corajoso" e "valente" ao apresentar a renúncia. Alencar está discutindo e analisando os vários cenários do desfecho da crise política.

Costa Neto esteve ao lado do vice-presidente em momentos importantes do governo. Em março do ano passado, fez duras críticas à política econômica, afirmando que o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, não entendia nada da área. Houve quem suspeitasse que Alencar estivesse por trás das declarações de Costa Neto. Para evitar interpretações "erradas", o vice pediu ao deputado do PL que parasse o bombardeio.

CONFISSÃO DE CULPA

Senadores do PSDB e PT partilharam ontem da tese de que a decisão de Costa Neto foi uma "confissão de culpa". A senadora Ideli Salvatti (PT-SC) disse que Costa Neto abandonou o mandato por admitir que recebeu dinheiro irregular para campanha eleitoral.

Para o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), outras renúncias serão anunciadas nos próximos dias. "Isso faz parte de uma estratégia das pessoas que não querem perder seus direitos políticos. Algumas renúncias serão chocantes, porque partirão de políticos conhecidos por suas biografias", disse o tucano, sugerindo que o deputado José Dirceu (PT-SP) está entre os que devem renunciar para não ser cassados.

Segundo o líder tucano, a renúncia ao mandato de Costa Neto não tem nada de "heróica". "Como esperar heroísmo de quem se beneficiou do mensalão?", questionou Virgílio. Ele acredita que a decisão do deputado é a prova de que as investigações da CPI dos Correios e do Conselho de Ética estão no caminho certo.

O líder do PFL no Senado, José Agripino (RN), disse que Costa Neto expôs o PT ao declarar que foi induzido ao erro pelo partido quando aceitou dinheiro ilegal para sua campanha. "O PT está inevitavelmente no centro do escândalo."