Título: 'Com ódio ou sem ódio, eles vão ter que me engolir', diz Lula
Autor: Angela Lacerda e Tânia Monteiro
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/08/2005, Nacional, p. A4

De volta à sua terra natal, Garanhuns (PE), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva retomou ontem frase famosa do ex-técnico da seleção brasileira Zagallo, para dizer aos opositores que terão de engoli-lo caso seja candidato de novo em 2006. "Nunca disse se seria ou não candidato à reeleição. Tenho compromisso de governar e, no momento certo, direi. Se for (candidato), com ódio ou sem ódio, eles vão ter que me engolir outra vez, porque o povo vai querer." Em Garanhuns Lula lançou o Plano Safra para Agricultura Familiar. Muito aplaudido pela platéia, na maioria trabalhadores rurais da Federação dos Trabalhadores na Agricultura, ligada à Contag -, Lula disse ter aprendido "com uma mulher analfabeta" (sua mãe) a ter "dignidade na cara", a respeitar e ser respeitado. "É o que faço com os outros e o que quero que façam comigo. Se querem respeito, me respeitem."

Lula disse não dever sua eleição a favor de ninguém. "Devo minha eleição ao povo, que acreditou e votou em mim. E é a ele que prestarei contas no momento certo." Contou já ter visto em jornais dizer que é preciso fazer o presidente "sangrar para chegar fraco em 2006" e ter ouvido que seria bom que não concorresse. Ressaltou que não foi ele que aprovou a reeleição. "Pelo contrário, votei contra a reeleição na Constituinte. Agora dizem que não posso concorrer? Com base em quê? Com medo de que eu possa provar que em 4 anos fiz mais do que eles (governo FHC) fizeram em 8 anos?"

Disse também que é preciso ficar atento com o que se lê e se vê. "Tem de saber o que é verdade e o que é mentira." Ao falar da crise, comentou que a cada dia surge uma denúncia. "Mas até agora, como não tem resultado da CPI, vamos aguardar."

Ele reiterou que o presidente só pode querer que haja justiça. "Vamos ser duros com os culpados e justos com os inocentes", disse. "Peço que a imprensa divulgue e peça desculpas aos que foram acusados injustamente, aos que não cometeram nenhum delito, mas ocuparam as páginas dos jornais."

Lula recebeu apoio do líder do MST Jaime Amorim e do presidente da Contag, Manoel dos Santos. "Não vamos para a rua, já estamos na rua para defender o presidente. Os que acham que vão confundir o povo podem tirar o cavalo da chuva", disse Santos. "A bandeira dá ética na política, contra a corrupção, por uma reforma agrária ampla e por justiça social, são nossas bandeiras, não são bandeiras da direita e do atraso", disse Amorim em seu discurso.

INSTITUIÇÕES

Depois, Lula foi para Teresina (PI), onde inaugurou obras na Vila Irmã Dulce, na periferia. Na mesma linha do discurso em Garanhuns, disse que não foi eleito por conchavos. "Eu devo minha eleição a 52 milhões de homens e mulheres deste país que acreditaram e votaram."

Ele pediu cautela aos adversários. "Se tem uma coisa que garanta o funcionamento da democracia são as instituições e temos de respeitá-las. Não brinquem, porque o País não comporta brincadeira de mau gosto", disse. "Este país já viu muitas enganações e está dizendo àqueles que já governaram: por favor, o presidente Lula não precisa de favor, não precisa de piedade. A única coisa que preciso é que não atrapalhe este país."

O cerimonial da Presidência impediu a entrada de faixas e cartazes contrários ao governo na inauguração. No discurso, Lula mudou sua avaliação da economia. Na semana passada pedira a adversários que "não brincassem" com a crise porque a economia ainda era muito frágil. Ontem assegurou o contrário. "Temos de ter em conta que o País não pode perder a oportunidade que está tendo e a economia nunca esteve tão sólida para a economia fragilizada que a gente tinha", declarou. "Ainda não fizemos tudo, mas já fizemos mais do que outros governos fizeram em 30 anos."

A crise também voltou a ser citada. "Vocês estão vendo o que está acontecendo em Brasília. Confusão daqui, dali", disse. "Da minha parte, sou daqueles que diz o seguinte: quem fizer alguma coisa errada tem de pagar. Seja meu amigo, seja meu inimigo, seja do meu partido, seja contra o meu partido, seja católico, seja ateu, seja preto, seja branco, seja mulher, seja homem. Se errou, tem de pagar pelo erro cometido porque nós temos clareza de que tem gente querendo apurar a verdade."

Em seguida, defendeu a CPI. "A CPI é um instrumento importante e vamos fazer que tenha todas as facilidades para funcionar. "Acho que tem gente que quer fazer apuração séria. Deputado, senador sério. Tem outros que gostam de fazer um pouco de encenação. Mas também estão no seu papel e não vamos achar ruim."