Título: 'Lula não gosta de trabalhar'
Autor: Roldão Arruda
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/08/2005, Nacional, p. A10

O deputado Roberto Jefferson (RJ), presidente licenciado do PTB e principal acusador no escândalo do mensalão, intensifica aos poucos seus ataques ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Não de forma direta, mas num movimento ensaiado de morde e assopra, avanços e recuos. Ele mostrou isso de forma plena durante um debate realizado ontem em São Paulo sobre a reforma política. Ao mesmo tempo em que disse ver o presidente como "um semideus", que nunca fez "nenhum gesto que permitisse desconfiar dele", Jefferson chamou-o de preguiçoso, realçou as relações dele com ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares e disse que é preciso investigar melhor o envolvimento de seus ministros com o mensalão. Chegou a dizer que a sociedade não deve ter medo do impeachment: "Tivemos um impeachment 13 anos atrás e nossas instituições democráticas não perderam nada. Pelo contrário, ganharam." O deputado afirmou que tem sido pressionado para que acuse o presidente. "Mas eu não posso acusá-lo", contrapôs. "O homem que teve 52 milhões de votos deve ter o benefício da dúvida. Para mim, é um semideus e eu jamais vi um ato dele que pudesse me dar uma convicção de culpa. Mas se me perguntassem: você votaria nele de novo? Eu responderia não. Porque ele não gosta de trabalhar e delegou o governo ao José Dirceu. Infelizmente, o negócio dele é passear de avião."

Falando num evento promovido pela Associação Comercial de São Paulo, Jefferson disse que não vai "cometer a irresponsabilidade de tentar destroçar moralmente o operário que chegou à Presidência da República". Em seguida, porém, mencionou a intimidade entre Lula e o ex-tesoureiro do PT, apontado como principal articulador do mensalão, ao lado do publicitário Marcos Valério. "No Palácio do Alvorada, num almoço de fim de ano com o presidente, quem é que de repente mete a mão na porta, entra e senta à direita de Deus pai? O tesoureiro do partido, que não é ministro e não tem nenhuma função parlamentar, mas tinha um prestígio louco."

BOMBA

Jefferson lançou dúvidas sobre os ministros: "Não sei por que só explode no Parlamento esse negócio do mensalão. Sabemos de ministros que mandaram sacar, mas como isso fecha no crime de responsabilidade, não se toca no assunto, como se fosse bomba. Mas secretários-executivos, chefes de gabinetes meteram a mão no jabá."

No conjunto de críticas que ia destilando aos poucos, entre uma sugestão e outra sobre a reforma política, o petebista insinuou a conivência do presidente com o esquema de caixa 2. "O caixa 2 é tão contundente na vida do País, que o supremo mandatário, que deveria tê-lo repelido, o admitiu para uma jornalista na França, dizendo que todo mundo faz isso e que o PT fez também."

Numa referência à recente decisão do Diretório Nacional do PT, que aceitou o pedido de afastamento do ex-tesoureiro, o deputado disse: "Delúbio será protegido pela estrutura do partido, a máfia. Não será jogado aos leões." Na opinião dele, o bode expiatório deverá ser Marcos Valério: "Ele foi usado pela estrutura que o Zé Dirceu e o Luiz Gushiken montaram e agora está sendo jogado às feras."