Título: Lula avisa que vai viajar mais, mesmo que oposição fique nervosa
Autor: Leonencio Nossa e Tania Monteiro
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/08/2005, Nacional, p. A11

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem, no programa quinzenal de rádio Café com o Presidente, que vai acelerar o ritmo de viagens por todo o País, participando de inaugurações, pois é "o momento da colheita" de seu governo. Apesar da crise política, ressaltou Lula, é preciso "tocar o barco" - "mesmo que isso provoque um certo nervosismo nos adversários". Na sexta-feira, o PFL entrou com representação na Procuradoria-Geral da República, acusando-o de fazer campanha antecipada na viagem ao Nordeste. "Eles dizem que estou fazendo campanha. Ora, meu Deus do céu, agora que estou viajando para inaugurar as coisas eles acham ruim?", reclamou. "Vou continuar viajando, vou viajar muito daqui para a frente, inaugurar todas as obras que começamos: seja estrada, ponte, viaduto, hidrelétrica, linha de transmissão, fábricas novas", avisou. "Eu pelo menos tenho uma agenda de viajar o Brasil. Este é o momento da colheita. Fizemos sacrifício em 2003, plantamos em 2004 e, agora, temos que colher em 2005."

As viagens ao exterior, que marcaram os dois primeiros anos de mandato, também foram defendidas: "A quantidade de viagens que eu fiz em 2003 e 2004, plantando uma imagem positiva do Brasil lá fora, está dando resultado agora."

Lula afirmou que não tem como acelerar as investigações. "Se alguém falhou, tem de pagar. Eu, se tivesse como encurtar isso, encurtaria, mas não tenho. Independentemente da crise, precisamos trabalhar", disse. "O governo não pode fazer nada, a não ser esperar o rito normal que tem a CPI, o Ministério Público, a Polícia Federal, a Controladoria-Geral."

Ele repetiu que sente "certa tristeza" porque o povo não merece o que está acontecendo. "Depois que tudo estiver apurado, os processos vão para a Justiça e a Justiça vai cumprir com sua parte. Todos nós nascemos no mundo para ser honestos, para ser éticos, para ser dignos."

No fim da tarde, ao desembarcar no Aeroporto da Pampulha, em Belo Horizonte, Lula manteve o discurso. Reafirmou que é favorável à apuração de todas as denúncias de corrupção, mas destacou que não admitirá que isso paralise o governo. "Eu quero apurar tudo, nós já fizemos muita coisa, e eu estou com uma vontade danada de mostrar pra essa gente que ainda tem muita coisa pra fazer", afirmou, segundo um vereador. "Não podemos parar."

MANIFESTAÇÕES

Nas poucas horas em que ficou na capital mineira, Lula encontrou apoio e críticas. Já no aeroporto, cerca de 200 sindicalistas e militantes de PT, PC do B e ONGs o esperavam com faixas e gritos de ordem. Em número menor, mas não menos barulhento, mulheres de militares faziam um protesto com panelas e buzinas, cobrando reajuste.

Após desembarcar, o presidente foi até os apoiadores e carregou no colo Letícia Viana, de 5 anos. Depois distribuiu abraços, obrigando a segurança a agir para evitar tumulto. Depois, Lula e a comitiva foram para o Teatro Sesi Minas, para a abertura da Semana Nacional de Cidadania e Solidariedade e o lançamento do prêmio ODM Brasil - Objetivos do Milênio.

Eles entraram pelos fundos do teatro e não viram a manifestação de cerca de 50 militantes de organizações sindicais e partidos como o PSTU, que gritavam palavras de ordem contra o presidente e o governo e levantavam faixas com referências às denúncias de corrupção. Outro grupo, de 50 petistas, manifestava apoio ao presidente.

Os coros de "Lula outra vez" e "Lula no xadrez" se confundiam. A disputa entre a torcida a favor, que resgatou o grito da eleição de 2002: "Olê, olê, olê, olá, Lula, Lula", e contra - "Valério foi para Brasília e junto com Lula formou uma quadrilha" ou "Lula já sabia, só não sei se recebia" - chegou ao confronto. No empurra-empurra alguns manifestantes chegaram a ser derrubados, mas os menos exaltados intervieram, parando a briga.

O barulho da manifestação não chegou ao interior do teatro. Ao ser anunciado, Lula foi ovacionado por petistas que estavam do lado de fora e acabaram entrando após o início da solenidade. O presidente encerrou seu discurso debaixo de intensas palmas e um coro: "Um, dois, três, é Lula outra vez."

Na cerimônia, Lula fez defesa veemente de sua política econômica e social e apresentou balanço detalhado de vários programas. Ao lado do governador de Minas, Aécio Neves (PSDB), e nove ministros, evitou usar o discurso, a maior parte lido, para falar da crise, como tem feito nos últimos dias. "Com bastante sacrifício, estamos mudando muito as condições de vida do povo pobre", disse. "Em relação à economia, contrariando o pessimismo de alguns, nestes 31 meses de governo tiramos o Brasil da estagnação, retomamos o desenvolvimento e geramos 3,135 milhões de empregos formais." E, ao defender o programa Fome Zero, assegurou: "Uma verdadeira revolução está acontecendo no Brasil."

PIMENTEL

Se Lula preferiu defender sua gestão, o prefeito Fernando Pimentel (PT), falou na crise. Muito aplaudido, ofereceu "irrestrita solidariedade" neste "conturbado momento político" do qual assegurou que "todos sairão mais fortes e comprometidos" com a ética.

"Todos estão no mesmo barco, no seu barco, presidente, e confiamos no timoneiro." O prefeito concluiu afirmando que ouviu de Lula, momentos antes, que ele estava "com alma forte e coração sereno". E acrescentou: "Continue assim, confiamos nas suas mãos limpas e firmes, no leme do nosso barco para chegar a um porto seguro".