Título: 60 anos e 30 mil ogivas depois
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Fonte: O Estado de São Paulo, 06/08/2005, Internacional, p. A18

Sessenta anos atrás, uma bomba atômica foi lançada sem nenhuma alerta no centro da cidade japonesa de Hiroshima. Cento e quarenta mil pessoas foram mortas, mais de 95% delas mulheres, crianças e não combatentes. Pelo menos metade das vítimas morreu instantaneamente e as outras pelos efeitos da radiação nos meses seguintes do fatídico ano de 1945. Três dias depois, a cidade de Nagasaki sofreu um ataque que deixou 80 mil mortos. As duas explosões atômicas foram as únicas até hoje contra seres humanos.

A magnitude das mortes foi enorme e em 14 de agosto de 1945 - cinco dias depois do ataque a Nagasaki - a Rádio Tokyo anunciou que o imperador japonês tinha aceitado render-se sob os termos dos Estados Unidos, encerrando a 2.ª Guerra Mundial.

Hoje, por um breve momento, os ônibus de Hiroshima pararão e a cidade ficará em silêncio. Com flores e água - simbolizando o sofrimento dos que morreram no inferno nuclear, Hiroshima lembrará como a explosão transformou a vida em morte e mudou para sempre o estilo de guerra.

Para marcar o 60.º aniversário do ataque, mais de 50 mil pessoas se reunirão hoje no Parque do Memorial à Paz, que uma vez ao ano torna-se o epicentro espiritual do movimento global contra as armas nucleares.

Participará das cerimônias um pequeno grupo de sobreviventes que moram no Brasil. Eles são membros da Associação das Vítimas da Bomba Atômica no Brasil, que reúne 142 sobreviventes e luta para que eles obtenham os mesmos direitos das vítimas das bombas de Hiroshima e Nagasaki que moram no Japão.

Um minuto de silêncio será feito às 8h15, o instante da explosão, e o prefeito de Hiroshima, Tadatoshi Akiba, fará um discurso pelo fim das armas atômicas. Hoje, cerca de 5 mil nomes serão acrescentados à lista dos mortos em Hiroshima.

O verdadeiro número de vítimas talvez nunca seja conhecido. Os funcionários de Hiroshima declararam que o número oficial de mortos é 237.062 - incluindo as pessoas inicialmente dadas como desaparecidas e os sobreviventes que morreram de doenças relacionadas à radiação, como o câncer.

Ontem, na véspera da cerimônia, o chefe da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), Mohamed el-Baradei, declarou que o horror de Hiroshima deveria lembrar ao mundo que as armas nucleares deveriam ser erradicadas.

"Deveríamos ser humildes e aprender com as lições de Hiroshima e Nagasaki", disse El-Baradei. "Não podemos permitir que 60 anos apaguem de nossa memória o que aconteceu. A única maneira de prevenir futuras Hiroshimas e Nagasakis é pôr fim às armas nucleares", acrescentou. O chefe da agência da ONU explicou que um mundo sem armas nucleares é um objetivo distante, já que ainda existem cerca de 30 mil ogivas nucleares.

O Japão apresentará em outubro um projeto de resolução durante a Assembléia-Geral da ONU pedindo a eliminação completa das armas nucleares.

O próprio governo japonês tem dúvidas sobre o êxito de sua proposta. A proposta busca aumentar as moratórias dos testes nucleares e negociar um tratado para proibir esse tipo de teste.