Título: Uruguai busca vítimas da ditadura
Autor: Ariel Palacios
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/08/2005, Internacional, p. A13

BUENOS AIRES - O Batalhão Número 14 do Exército, no município de Canelones, próximo à Montevidéu, foi o cenário ontem das primeiras escavações ordenadas pelo governo do Uruguai para localizar os corpos de desaparecidos políticos, vítimas da ditadura militar que governou esse país entre 1973 e 1985. As escavações começaram poucas horas após o anúncio do presidente Tabaré Vázquez de que há 99% de certeza de que ali foi enterrada María Claudia García Goyena de Gelman, nora do poeta argentino Juan Gelman e uma das mais famosas desaparecidas do regime militar.

Sua filha, Macarena, nascida durante o cativeiro de sua mãe e que apenas há cinco anos soube que era filha de desaparecidos, visitou o lugar onde se realizavam as escavações.

Na segunda-feira à noite, Vázquez anunciou a entrega de um relatório das Forças Armadas que detalha o paradeiro dos corpos dos desaparecidos.

Durante a ditadura os militares assassinaram 32 opositores políticos e suspeitos de subversão no Uruguai. Mas, em conjunto com os regimes militares da Argentina, Chile e Paraguai, os repressores do Uruguai foram responsáveis pela tortura e morte de outros 132 uruguaios fora do território nacional. No total, 164 uruguaios foram mortos pela repressão militar no Cone Sul.

Vázquez definiu o anúncio como histórico, já que era a primeira vez, 20 anos após o fim da ditadura, que as Forças Armadas do Uruguai entregavam informações a um governo civil sobre o paradeiro dos corpos. Além disso, os militares informaram sobre o modus operandi dos seqüestros e os repressores envolvidos nos casos.

Nunca antes os militares haviam admitido a participação de membros das Forças Armadas no assassinato de civis. Os detalhes do relatório, no entanto, não foram divulgados.

Vázquez cumpre sua promessa de campanha de avançar nas investigações sobre os crimes contra a humanidade ocorridos durante a ditadura uruguaia.

No Uruguai, os militares envolvidos na repressão foram beneficiados pela Lei de Caducidade da Pretensão Punitiva do Estado, que impediu seu julgamento.

A lei teve o apoio dos partidos conservadores, que pretendiam evitar que o Uruguai sofresse levantes nos quartéis, tal como enfrentava na época o então presidente argentino Raúl Alfonsín. Mas a lei, confirmada por um plebiscito em 1989, não impedia a investigação.