Título: Elevação de superávit enfrenta resistências
Autor: Alaor Barbosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/08/2005, Economia & Negócios, p. B4

Mantega e Dilma se opõem ao plano de Palocci de obter 5% do PIB este ano

BRASÍLIA - O ministro da Fazenda, Antonio Palocci, enfrenta grande resistência no governo e no PT à sua proposta de elevar o superávit primário deste ano para 5% do Produto Interno Bruto (PIB). O presidente do BNDES, Guido Mantega, é hoje a voz que expressa de forma mais aberta a defesa do superávit de 4,25%. Segundo fontes governamentais, Mantega conta com o apoio da ministra da Casa Civil, Dilma Roussef, e de outros importantes integrantes do primeiro escalão do governo. Esse grupo quer que Palocci execute a programação orçamentária e financeira aprovada pelo presidente Lula no início do ano e libere os recursos bloqueados, principalmente para os investimentos em infra-estrutura. As informações que circulam na Esplanada dos Ministérios dão conta de que a execução orçamentária deste ano é mais rigorosa que a de 2004 e o superávit primário em 12 meses terminados em julho está em torno de 5,3% do PIB.

O atrito do grupo com Palocci tornou-se mais forte na quarta-feira, quando Mantega promoveu encontro com 12 economistas, no BNDES, com o objetivo de discutir alternativas para o crescimento sustentado da economia e a proposta de déficit nominal zero apresentada pelo Deputado Delfim Netto (PP-SP). A conclusão unânime dos economistas foi que um aumento do superávit não é garantia de que o Banco Central reduzirá os juros.

Os economistas destacaram o fato de que toda vez que o governo aumenta o superávit primário os investimentos são sacrificados. Por isso, a elevação do superávit não foi considerada solução para o baixo crescimento da economia, mas uma medida que pode agravá-lo.

Outra idéia que predominou na reunião foi que a baixa eficiência contracionista da política monetária é que explica as altas taxas de juros. Assim, uma melhor coordenação da administração da dívida pública e da política monetária poderia ajudar a reduzir os juros. O principal nó a ser desatado, segundo essa avaliação, é reduzir substancialmente a parcela da dívida pública atrelada à taxa Selic.

A reunião ocorreu 24 horas antes de um seminário articulado por Palocci, que seria realizado pelo Ipea, em torno das possibilidades de aperfeiçoamento do atual ajuste fiscal e da definição de metas de longo prazo. Nesse seminário, o Ipea iria apresentar um estudo em defesa da elevação do superávit primário para 5% do PIB, com o argumento principal de que essa meta não implicaria novos cortes de gastos.

A reunião feita por Mantega foi interpretada nos Ministérios da Fazenda e do Planejamento como evidente tentativa de mostrar à opinião pública que não há unanimidade no governo em torno da elevação do superávit. O clima piorou com a decisão do Senado de elevar o salário mínimo para R$ 384.

Na noite de quarta-feira, Palocci e o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, decidiram cancelar o seminário. "Palocci montou um cenário para colher o superávit de 5% e terminou com o superávit de 4,25% na mão", sintetizou ontem uma fonte governamental.

Assessores da Fazenda e do Planejamento argumentam que, para reduzir o superávit, o governo terá de gastar cerca de R$ 20 bilhões no segundo semestre, algo incompatível com a política do BC. Os gastos, no entanto, já começaram: o presidente Lula concedeu reajuste aos militares, de 13% em outubro e 10% em agosto de 2006, com custo estimado em R$ 5 bilhões, dos quais R$ 800 milhões este ano.