Título: Gtech acusa Buratti de exigir propina de R$ 6 milhões
Autor: Rosa Costa
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/08/2005, Nacional, p. A10

O ex-presidente e o diretor da Gtech do Brasil, Antonio Carlos Lino da Rocha e Marcelo Rovai, acusaram ontem o advogado Rogério Buratti de exigir propina de R$ 6 milhões, a mando do então subchefe da Casa Civil Waldomiro Diniz, para que a empresa renovasse o contrato com a Caixa Econômica Federal, em abril de 2003. Na CPI dos Bingos, eles contaram que Waldomiro sempre se apresentava como representante do governo. "Ele dizia que, pelo seu conhecimento em loterias, tinha sido designado pela nova administração para saber o que estava ocorrendo com as loterias", afirmou Rovai. Ao justificar porque aceitou se encontrar com ele, Rovai disse que tinha Waldomiro como "o terceiro homem na hierarquia do governo". Sobre Buratti, contou que ele agia como se tivesse poder suficiente para impedir a assinatura do contrato. E que, logo na primeira reunião, foi avisando, "sem meias palavras": "Se tivessem me contratado antes, poderiam abater o preço em 8%; como não fizeram isso, vão ter de dar os 15% de desconto à Caixa e ainda me pagar". Esse e outros encontros ocorreram no Hotel Blue Three.

Marcelo Rovai disse ter estranhado a forma como Buratti se despediu, dizendo que iria transmitir o resultado da conversa ao seu pessoal. "Foi quando ele apontou em direção ao Palácio da Alvorada", lembrou.

Na conversa seguinte, Buratti disse que seu pessoal tinha concordado com a renovação do contrato, desde que os R$ 6 milhões fossem pagos.

Além de investigado pela CPI dos Bingos, Rogério Buratti será indiciado pela Polícia Civil e a Promotoria de Ribeirão Preto por formação de quadrilha para fraudar licitações. Ele foi assessor parlamentar de três petistas de peso: José Dirceu, João Paulo Cunha e Antonio Palocci, a quem secretariou na prefeitura de Ribeirão Preto, na gestão do hoje ministro da Fazenda.

Os senadores suspeitam que, apesar da negativa, a Gtech pagou, sim, a propina de R$ 6 milhões para evitar o rompimento do contrato. Lino da Rocha reconheceu que, se perdesse o negócio, a empresa ficaria sem 8% de seu faturamento total/ano, além de arcar com a perda do investimento de R$ 250 milhões feitos no Brasil. Endossa a tese do pagamento da propina o fato de o governo ter favorecido a Gtech ao criar um novo jogo, a Loto Fácil, e por ter aumentado, na ocasião, o preço da Mega Sena em 50%.

As duas medidas aumentaram o faturamento da Gtech proporcionalmente à arrecadação das loterias. "A empresa ficou na parede, não tinha a quem recorrer", observou o senador Romeu Tuma. Segundo ele, o método utilizado lembra o que foi denunciado pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), tendo a Portugal Telecom como alvo. "O objetivo, de arrecadação de valores, é o mesmo", afirmou.

A prova mais consistente mais consistente da aceitação da propina foi dada pela quebra de sigilos telefônicos pela Polícia Federal. Ficou provado que Marcelo Rovai mentiu duas vezes: ao declarar à CPI que jamais retornou as ligações de Buratti e ao dizer que não teve mais notícias dele depois da assinatura do contrato, dia 8 de abril.

Os dados mostram que ele, na semana da negociação, recebeu 16 ligações de Buratti, tendo ligado 4 vezes para o advogado. Os contatos se intensificaram no dia 9 de abril, quando Buratti lhe ligou 4 vezes. Há ainda notícias de que Rovai teria estado na empresa Leão Leão, ligada a Buratti, em Ribeirão Preto. Ao final desse contrato, no valor de US$ 100 milhões por ano, em maio último, a CEF fez uma nova prorrogação com a Gtech, por mais um ano.

O terceiro convocado da CPI, o ex-advogado da Gtech Enrico Gianelli faltou ao depoimento. Ele foi acusado por Lino Rocha e por Rovai de ser cúmplice do esquema de extorsão, já que atuou como intermediário dos "recados" de Waldomiro e Buratti. Caso falte a uma nova convocação, a comissão vai usar seu poder de polícia e levá-lo a depor à força.