Título: Um teste de DNA - e, de repente, pai
Autor: Luciana Garbin
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/08/2005, Metrópole, p. C8

Foi por meio de um laudo. Científico, frio, aberto num laboratório ou diante do juiz. Mas que despertou uma avalanche de emoções. Assim a paternidade chegou para eles. Hoje, Dia dos Pais, estão divididos. Uma parte se alegra ao falar da descoberta de filhos inesperados. Enquanto outra lamenta a falta de convívio em meio a relações familiares conturbadas. "Tomei conhecimento da existência da minha filha quando ela tinha 3 anos e isso deu um giro na minha vida", conta o gerente comercial Cristiano Maia, de 33, pai de Ariane, hoje com 8. "Agora tenho, por exemplo, visão completamente diferente do Dia dos Pais. De repente, além de comprar presente para meu pai, comecei também a ganhar."

Como outros pais por DNA, Cristiano não pôde acompanhar o primeiro choro, o primeiro sorriso, as trocas de fraldas. E teve de submeter-se a procedimentos judiciais para incluir seu nome na certidão de nascimento e acertar detalhes da pensão. Mas faz parte de um número cada vez maior de brasileiros cuja vida acabou influenciada pela capacidade do DNA de eliminar dúvidas sobre um assunto tão antigo quanto a humanidade - a paternidade.

Mesmo solteiro, Cristiano conta que a notícia da filha caiu como uma bomba, há 5 anos. "Na época eu tinha uma namorada e é difícil, envolve ciúme, sua vida toma outro rumo." Em vez de esperar anos para que o caso se desenrolasse na Justiça, ele optou, porém, por acelerá-lo. E pagou R$ 2.500 - quase três vezes o preço atual - pelo teste de DNA. "Ele foi decisivo. Hoje a gente convive numa boa, temos um relacionamento muito bom", conta.

"No meu caso, o Bruno já veio pronto. É um rapaz educado, inteligente, tenho o maior orgulho dele", diz o cantor Amado Batista, sobre o filho que conheceu já adolescente e este ano montou com outro de seus filhos a dupla Erich e Bruno.

O cantor conta que há 21 anos namorava a mãe de Bruno quando mudou para São Paulo. Os dois terminaram e, meses depois, ele chegou a encontrá-la grávida, mas sem saber que o filho era seu. Em 1991, ela morreu e a família entrou na Justiça. "O engraçado é que recebi a notificação do juiz no mesmo dia em que tinha reunido meus dois filhos do casamento para falar de um outro menino que reconheci depois do DNA em Minas, o Rick", conta Amado.

Hoje, Bruno vive na casa do cantor e se anima ao falar do pai. "A primeira vez que o vi foi aos 17 anos, na hora de fazer o DNA. Depois do resultado, fui passar duas semanas na fazenda com ele, conheci meus irmãos e todos me trataram muito bem", conta. "No início, fiquei com medo de ter um bloqueio, mas isso não aconteceu. Ele acrescentou muita coisa na minha vida. Agora, quando a gente tá junto, é só festa."

Um final feliz parecido com o da história do apresentador Otávio Mesquita e de seu filho Luiz Otávio, de 12 anos, descoberto num exame de DNA quando tinha 1. "Quando a mãe me contou, eu tava em fim de casamento e tive a reação estranha que todo homem tem: ir contra, dizer que não era meu", lembra.

O caso foi parar na Justiça e, na semana em que contestou a ação, Mesquita teve um sonho que mudou o rumo do caso. Estava se afogando quando John, o filho do casamento, atirou-lhe uma corda. Com o atrito, as mãos do menino, que também tinha 1 ano, começaram a sangrar. Nisso apareceu outra criança da mesma idade, cujo sangue das mãos começou a misturar-se com o de John. Juntos, os dois conseguiram puxá-lo para a margem. "Quando saí, o menino correu e eu não conseguia ver seu rosto. E meu filho dizia: papai, você tem de ir atrás dele."

Mesquita acordou às 4 da manhã e não conseguiu mais dormir. Horas depois, chamou os advogados e pediu para fazer o teste de DNA. Hoje, John e Luiz Otávio mantêm relação próxima, apesar de viverem em cidades diferentes. "As crianças não são responsáveis por nossas irresponsabilidades. Evito falar de vida pessoal, mas esse assunto faço questão de comentar e faria até campanha beneficente para incentivar que os pais assumissem. A maioria não faz por medo, tem mulher, mas o universo feminino é capaz de entender."

Nem todos, porém, conseguem convívio tão bom com os filhos. "Nossa relação é um pouco afastada, vejo meu filho de três em três meses", diz o mecânico Brivaldo Melo da Silva, de 35 anos, pai de Otávio, de 10. "A mãe tem outro marido e, por mais que eu seja bem recebido na casa deles, não dá pra passar muito tempo, fica um clima."

Após cinco anos de ação da Justiça e a confirmação da paternidade pelo DNA, Brivaldo registrou o menino e acertou a pensão. Mas lamenta não ter com Otávio a mesma convivência que tem com Fernando, o outro filho. Os dois têm a mesma idade, mas ainda não se conhecem. "Sabe essa coisa de o menino ter problema na escola e você ir lá resolver, se machucar e você levar ao hospital? Nunca pude ter com ele", diz. "Mas torço para que daqui a dois, três anos, com ele mais rapazinho, melhore. Aí, quem sabe, vamos poder viajar, passar fim de semana, ficar mais junto."