Título: Comércio corre risco calculado
Autor: Márcia De Chiara
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/08/2005, Economia & Negócios, p. B1,3

Riachuelo afrouxa critérios de concessão e calote sobe um ponto, mas alta nas vendas mais que compensa a perda

A mudança de patamar nos índices de inadimplência registrada neste ano reflete não apenas a cobiça dos bancos em disputar os financiamentos ao consumidor oferecendo mais crédito, mas também a agressividade das lojas para enfrentar concorrência. As Lojas Riachuelo, por exemplo, especializadas em artigos de vestuário, registraram aumento de um ponto porcentual, de 3,5% para 4,5%, nos financiamentos atrasados acima de 180 dias de dezembro para cá. "Estabelecemos como meta o aumento em um ponto da inadimplência. Estávamos sendo excessivamente rigorosos", diz o vice-presidente da empresa, Flávio Rocha. "Nós dissemos não para 50% dos clientes que nos procuraram em 2004."

A flexibilização nos critérios de aprovação do crédito mais que compensou, segundo o executivo. Ele conta que, só no primeiro trimestre, as vendas cresceram 40% em razão do afrouxamento do crédito. O plano de pagamento de 5 vezes sem juros responde por 70% das vendas da companhia , que deve faturar neste ano R$ 1,8 bilhão .

Rocha observa que anteriormente a rede não vendia a prazo para o cliente que não comprovasse residência fixa por mais de 180 dias. Apesar da alta do calote, a empresa não aumentou a taxa cobrada do consumidor para compensar a perda. "Mantivemos os juros", diz o vice-presidente.

Na avaliação de Érico Sodré Quirino Ferreira, presidente da Acrefi, entidade que reúne as financeiras, essa estratégia de ampliar a meta de inadimplência tem um risco calculado e, por isso, não preocupa. As companhias aumentam a fatia de mercado, crescem vendas e diluem o custo, que já considera uma inadimplência maior. "O grande problema é errar nas contas", pondera.

Já o supervisor geral das Lojas Cem, Valdemir Colleone, considera essa estratégia uma "loucura". "Volume tem limite e pode gerar prejuízo", diz o executivo. Desde março, as Lojas Cem registram inadimplência de 4,5% nos créditos a receber atrasados acima de 180 dias. "Não conseguimos baixar esse índice", diz Colleone. A média histórica de atraso na rede é de 3%.

Ao contrário da Riachuelo, a Cem está mais rigorosa na aprovação do crédito a clientes. "O que está se disseminando é o hábito de ser desonesto, com toda essa balbúrdia no País. Mas nas pequenas cidades esse movimento é menor, porque o cidadão ainda zela pelo nome e tem vergonha na cara."

Mesmo com risco calculado, um agravante para a inadimplência é se a economia for contaminada pela crise política e ocorrer uma desaceleração no ritmo de atividade, ressalta o vice-presidente da Anefac, Miguel Ribeiro de Oliveira.