Título: Casal da 'época da compulsória' faz 50 anos de união
Autor: Ricardo Westin
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/08/2005, Vida&, p. A13

JUNTOS NA DOENÇA: Quando Santinha procurava a mãe e, joelhos esfolados pelas travessuras de criança, dizia não sentir dor, via o mesmo gesto. "Ela coçava a cabeça. Aprendi que significava que ela estava diante de um grande problema", conta a mineira de 69 anos, internada pela primeira vez há 53, na "época da compulsória". Diante da doença da filha, a mãe fugiu. "Ela me largou lá em casa, sem comida, sem água", recorda Maria Conceição dos Santos, a Santinha, que teve as pernas amputadas e dedos das mãos mutilados. Ela vive no Hospital Estadual Tavares Macedo, em Itaboraí (RJ), um dos 30 hospitais colônias de ex-doentes de hanseníase.

O preconceito, segundo ela, impede que pacientes saiam até hoje. "Somos como mortos-vivos. Ninguém quer chegar perto, dar emprego. Pura ignorância", desabafa.

Internada aos 16, em Ubá (MG), casou-se com outro interno. Ela e Ataíde de Souza, de 73 anos, estão prestes a completar 50 anos de casados. Se no passado Ataíde deixou tudo para seguir com Santinha para o Tavares Macedo, para amputar uma perna, há três meses foi ela que deixou uma casa da colônia para morar num cômodo ao lado da enfermaria, onde o marido está internado, com problemas renais.

Nas paredes do pequeno cômodo, há fotografias do filho e do neto. "Vêm nos visitar uma vez por mês, pois moram longe", justifica ela.

A família poderia ser maior, mas duas filhas morreram após ser tiradas de Santinha. "Disseram que elas morreram. Meu filho acha que foram dadas para outras pessoas", conta.