Título: 'É só apurar que aparecem outros esquemas'
Autor: Eduardo Kattah
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/08/2005, Nacional, p. A7

Sem citar nomes, Marcos Valério diz que grandes bancos e empreiteiras financiaram campanhas no passado

BELO HORIZONTE - O empresário Marcos Valério Fernandes de Souza sugeriu que se as investigações forem aprofundadas, outros esquemas de financiamento de caixa 2 de campanhas eleitorais no País serão descobertos. "Há outros tipos de financiamentos", disse o empresário mineiro, em entrevista publicada ontem pelo jornal O Tempo, de Belo Horizonte. "Hoje, a SMPB e a DNA estão na berlinda, mas podem ser descobertas grandes empreiteiras ou grandes bancos que financiavam (campanhas) no passado. Tem de deixar de hipocrisia." Valério, sem dar detalhes ou citar nomes, disse que se as "as pessoas tiverem coragem de admitir, outros esquemas aparecerão". Para ele, "é só querer apurar que se descobrirá a participação de grandes empreiteiras e bancos".

As investigações em curso detectaram que o empresário operou o financiamento de caixa 2 para o PT e partidos da coligação liderada pelo PSDB na campanha à reeleição do então governador de Minas, Eduardo Azeredo, em 1998.

Protagonista da crise, Valério reconhece que não é inocente, mas se considera traído e disse que está sendo vítima de uma pressão do governo federal para "blindar" políticos do PT, como o ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu, e o ex-presidente da legenda, José Genoino.

"Deixa o empresário estourar porque o povo precisa de alguém para ser o boi de piranha. Alguém que não é do meio deles, que não é petista de carteirinha", afirmou. "A população precisa de um Tiradentes para ser enforcado. É assim que estão agindo em relação a mim."

Valério, no entanto, mais uma vez fez questão de poupar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "As pessoas que me traíram foram as mesmas que traíram o presidente. As que me abandonaram foram as que ocultaram tudo do presidente. Acho que Lula não sabia."

RECLUSÃO

Ele voltou a rechaçar a comparação com Paulo César Farias, o ex-tesoureiro da campanha de Fernando Collor de Melo à Presidência. "O PC arrecadava dinheiro com os empresários e ficou calado diante das denúncias. Eu fiz empréstimos pelas minhas próprias empresas e não devo lealdade a ninguém. Estou falando tudo o que sei."

O empresário também reafirmou que "a história do Brasil" mostra que ele deve temer pela vida (PC foi assassinado). E revelou que já recebeu "recados" para ficar em silêncio. Os recados teriam sido dados por telefone, e-mail, além de bilhetes deixados no pára-brisa do carro e na sua casa no bairro Castelo. Atualmente, Valério vive recluso com a família na residência do condomínio Retiro do Chalé, em Brumadinho, na Grande Belo Horizonte.

Amanhã, Valério deverá depor sobre dois inquéritos na Polícia Federal, na capital mineira. Um deles refere-se ao empréstimo tomado pela DNA no Banco Rural, em 1998. A denúncia é que o empréstimo, cujo valor inicial era de R$ 8,35 milhões, foi usado para financiar o caixa 2 da campanha à reeleição de Azeredo. O outro inquérito refere-se à quitação supostamente fraudulenta de um empréstimo de R$ 1,854 milhão concedido em junho de 1996 pelo Banco de Crédito Real de Minas Gerais (Credireal), privatizado no ano seguinte. O Ministério Público Estadual acusa a SMPB e seus sócios de pagarem a dívida com uma fazenda superfaturada, que não valia mais que R$ 330 mil.