Título: Aos 46 anos, Barbie ainda é sucesso e vende jogos, iPod, roupa, mala, etc.
Autor: Carlos Franco
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/08/2005, Economia & Negócios, p. B10

A americana Mattel, maior fabricante mundial de brinquedos, faturou US$ 5 bilhões no ano passado. Desse montante, US$ 3 bilhões vieram das vendas de uma boneca que é o retrato do "american way of life" dos anos 50, a Barbie. Lançada em março de 1959, a boneca é um fenômeno, a tal ponto que a cada três segundos uma é vendida ao redor do planeta, para a alegria dos acionistas da empresa com sede em El Segundo, Califórnia. Mas qual é a estratégia da Mattel para manter as vendas e Barbie na crista da onda, num mundo, sobretudo o infantil, que caminha a passos rápidos para as realidades virtuais e digitais? Mais: onde as crianças de 5 a 8 anos brincam de casinha e bonecas nas grandes metrópoles?

O vice-presidente da Mattel para Ásia, Pacífico, América Latina e Canadá, John Cullen, diz que a matemática da Barbie é simples: ela é a líder do mercado "fashion doll" e é a líder do mercado de licenciamento voltado ao público infantil e, por isso, pode ousar com mais folga, com novos lançamentos e, com eles, permanecer moderna e atual. "Só que não estamos distantes, como muitos pensam, das novas tendências. Ao contrário, temos acordos de licenciamento pelo qual lançamos o iPod da Barbie e, antes, o seu notebook, o computador de mão." O iPod é o aparelho que permite armazenar e ouvir músicas baixadas da internet.

No território dos videogames, que chegaram a movimentar no ano passado US$ 7 bilhões nos Estados Unidos, valor muito próximo dos US$ 9 bilhões do cinema, a Barbie ainda não está presente, mas a empresa está atenta. Érica Giacomelli, gerente de Licenciamento da Mattel no Brasil, ressalta, porém, que a empresa tem investido pesado em interatividade pela internet. "Temos registrado acessos únicos de 2,5 milhões por mês. O que é altíssimo, e a maioria busca a integração com o universo Barbie e outras crianças por meio de uma comunicação divertida, na linha dos games."

Além do licenciamento, que chega a responder por uma fatia importante do negócio Barbie no mundo e é a área que Cullen comanda nas regiões pelas quais responde, a Mattel encontrou no entretenimento uma forma de também sustentar as vendas da boneca. E, com isso, dar fôlego permanente a essa indústria do licenciamento da marca.

Nos últimos cinco anos, a empresa firmou parceria com a Universal para a produção desses filmes - cujo investimento retorna na comercialização de DVDs e fitas VHS de vídeo. O primeiro da série foi Barbie e o Quebra-Nozes, seguido de Rapunzel, Lago dos Cisnes e A princesa e a plebéia. Este ano, pela primeira vez a empresa está trabalhando com dois filmes: Barbie Fairytopia (pautado nas fadas) e Magia dos Alados (que dá seqüência ao primeiro, acrescentando cavalos alados e outros animais, que viram acessórios da boneca).

A Mattel também pretende estrear em dois meses a montagem de Fairytopia na Broadway e de lá sair para outras cidades. Cullen está certo de que essa é uma estratégia que garante, mais que a exposição da marca, a venda de produtos licenciados e com eles muita propaganda em torno da boneca.

O Brasil, diz Cullen, também entrou na rota de uma outra vertente com a qual a empresa está revigorando a marca: a moda fashion adulta. Na noite de quinta-feira, a modelo Ana Hickman desfilou, em São Paulo, a coleção Vintage Doc Dog, que é o novo negócio da Mattel Brasil, roupas e acessórios para adultos. São roupas com dose de ousadia, mas que têm a ver com o estilo que a boneca espalhou pelos 150 países em que é comercializada. Com seu 1,85 metro de altura e pernas esculturais de 1,20 metro, Ana Hickman parecia a própria boneca na passarela e elogiou o que vestiu, que mescla a inocência com a elegância adulta.

Cullen diz que a fórmula está fazendo sucesso no Japão, onde existem 21 lojas vendendo produtos de roupas com o estilo Barbie para adultos e 15 para coleções infantis. "Esse é um mercado que tem tudo para dar um grande salto, porque envolve calçados e acessórios." Érica tem um bom exemplo: "A marca foi licenciada para malas e frasqueiras para meninas pela Primícia, que depois solicitou o licenciamento de malas para adultos. Resultado: a previsão de vender 5 mil peças em 6 meses se cumpriu no mês de lançamento".

Paralelamente à moda Barbie para adultos, a Mattel também direciona para o mercado masculino a linha HotWheels, onde tem apresentado inovações nos circuitos de corrida e nos carros. "É uma forma de atingirmos o consumidor masculino, precisamente a criança, mas o processo de construção de marca é o mesmo."

O executivo que comandou os negócios da Mattel por três anos no Japão diz que a força da Barbie tradicional é tanta que a empresa chegou a prensar bonecas com olhos amendoados e cabelos pretos. "Não fez o menor sucesso, ficaram nas prateleiras. As meninas asiáticas queriam a Barbie 'blond girl', como foi concebida. Rejeitaram a inovação que aproximava a boneca dos traços étnicos da região."

PRESENTE DE MÃE PARA FILHA

A Barbie nasceu das mãos do designer Jack Ryan, que em 1958 recebeu do casal Ruth e Elliot Handler, o dono da Mattel, a encomenda de criar uma boneca adulta. Com ela, o casal queria homenagear uma das filhas e manter o encanto das bonecas por mais tempo. Mãe de Ken, Skipper e Barbara, foi Ruth quem teve a idéia de transformar em bonecos os três filhos, começando por Barbara, que ela chamava de Barbie, depois Ken e Skipper.

Apresentada na Feira de Brinquedos de Nova York de 1959, Barbie rapidamente se transformou em sucesso. Loura, numa época em que "blond girls" como Marilyn Monroe povoavam os sonhos da América, e enquadrada no estilo que o líder dos Aliados da 2.ª Guerra Mundial divulgava, ela ganhou o mundo.

Do lançamento até hoje, a Barbie acompanhou a evolução dos figurinos e do comportamento. Foi hippie, virou princesa, ganhou amigas indianas e africanas e conquistou seu lugar no hall da fama, invadindo outros mercados na forma de bolsas, sacolas e até sendo imitada em cirurgias plásticas, sem falar no uso como manequim de costureiros, com um corpo de 29 centímetros distribuídos milimetricamente. Hoje, ela é classificada como rainha do mercado "fashion doll", fazendo jus a costureiros como Dior, Yves Saint-Laurent, Pierre Balmain e tantos outros que lhe emprestaram agulhas, panos e decotes.

Uma imagem que seduz a ponto de o vice-presidente da Mattel ver em Ana Hickmann uma Barbie de verdade na passarela montada na última quinta-feira, no Prêt-à-porter Brasil, no Jockey Clube de São Paulo. Ana Hickmann agradeceu o elogio com o mesmo olhar vivaz e impenetrável da boneca.