Título: Atenção ao plantio
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Fonte: O Estado de São Paulo, 14/08/2005, Notas e Informações, p. A3

Está aberto oficialmente o financiamento da próxima safra de soja, milho, feijão, arroz e outros grãos e oleaginosas, segundo anúncio do Ministério da Agricultura e do Banco do Brasil. Os agricultores têm à sua disposição desde sexta-feira os primeiros R$ 4 bilhões de um total de R$ 45 bilhões programado pelo governo. A temporada foi ruim para boa parte dos produtores e os problemas não foram todos equacionados. Mas em breve será preciso iniciar o plantio das culturas de verão e será bom o governo se mostrar mais presente e claramente comprometido com o respaldo à agricultura - bem mais do que foi durante a safra 2004-2005.

A equipe econômica aceitou prorrogar para o primeiro semestre de 2006 as dívidas de custeio com vencimento em junho, julho e agosto deste ano, mas até o fim de semana as providências práticas não haviam sido tomadas. O governo deveria ter sido muito mais ágil na prestação do socorro. Se tivesse atuado com maior prontidão, apoiando os atingidos pela seca e os mais prejudicados pela evolução dos preços e do câmbio, talvez tivesse ficado menos sujeito a pressões da bancada ruralista neste momento de fraqueza política. Mas foi muito lento, avaliou mal as dificuldades do setor e agora é quase certo que pague por esse erro político. O prometido reescalonamento das dívidas provavelmente será mais amplo do que teria sido, se a intervenção tivesse ocorrido mais cedo e com a discriminação necessária. Quanto maior o total reescalonado, tanto menor será o volume disponível para novo financiamento, como advertiu o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues. As estimativas de produção para a temporada 2005-2006 têm ficado entre 120 milhões e 126 milhões de toneladas. Tanto os cálculos do Ministério da Agricultura quanto os de escritórios independentes apontam para essa faixa. Com chuvas bem distribuídas e no momento certo, a safra será maior que a anterior, agora estimada em 112,3 milhões de toneladas.

Se tudo houvesse corrido normalmente neste ano, porém, o Brasil poderia esperar para a próxima safra uma colheita na vizinhança de 130 milhões de toneladas de grãos de oleaginosas. Mas a expectativa dominante, agora, é de um plantio tímido, com redução de área para algumas culturas importantes e uso menos intenso de recursos tecnológicos.

A agroindústria foi severamente afetada, no primeiro semestre, pelas dificuldades dos agricultores. A produção de fertilizantes foi 14,5% menor que a de janeiro a junho do ano passado. A de máquinas e equipamentos ficou 36,3% abaixo da observada um ano antes.

Mesmo quando não sofreram perdas causadas pela seca ou não tiveram de enfrentar reduções de preços internacionais, muitos agricultores tiveram a rentabilidade afetada pela evolução dos custos e do câmbio. Os mais prejudicados perderam poder de compra e isso explica, em parte, a redução das vendas de insumos para lavouras. Outros, mesmo tendo lucros, preferiram adiar as compras, à espera de sinais mais claros da evolução dos mercados, do câmbio e das condições de crédito.

A agropecuária modernizou-se amplamente nos últimos 20 anos e sua produção deu um salto notável nos últimos 10. Tem sido fator de grande importância para a estabilização de preços internos, para a geração de superávits comerciais e a sustentação da atividade econômica.

A produção do campo é o miolo de um importante sistema de produção, que envolve, numa ponta, os fabricantes de equipamentos e insumos e, na outra, as indústrias processadoras da matéria-prima fornecida pelo campo. Essa atividade tem riscos e características econômicas peculiares, que justificam atenções especiais do governo. Não se trata de conceder ao setor subsídios indiscriminados, aos quais a diplomacia econômica do Brasil se opõe, corretamente, mas de proporcionar aos produtores as condições de segurança compatíveis com a natureza da atividade. Sistemas eficientes de seguro, de financiamento e de proteção sanitária, para citar só alguns, são elementos importantes dessas condições, às quais o governo, e não só o Ministério da Agricultura, deveria ser mais atento.