Título: Envolvidos em denúncias apostam no corpo a corpo para reverter rejeição
Autor: Carlos Marchi e Rodrigo Pereira
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/08/2005, Nacional, p. A13

As professoras de ginástica Karen de Souza Silva e Rosa Pereira, do São Paulo Athletic Club, se acham privilegiadas. Karen, que anulou o voto nas três últimas eleições, e Rosa, que é eleitora tucana, se dizem sem responsabilidade no escândalo do mensalão. Mas pelo menos 2,2 milhões de eleitores podem se sentir desconfortáveis de terem dado seus votos, em 2002, a deputados agora envolvidos com o escândalo do mensalão. Esses eleitores revelam um desencanto com os parlamentares que ajudaram a eleger, mas a maioria não desanima: vai mudar o voto. Alguns crucificam o destinatário de seu voto, mas outros dão a seus candidatos de 2002 o benefício da dúvida. Em todos, apenas uma certeza: deputado que levou dinheiro comprovado não leva mais o voto.

Os destinatários do voto, de outro lado, guardam algumas esperanças. O deputado João Paulo Cunha (PT-SP) diz que vai concluir a sua defesa e depois passará de seis a oito meses em Osasco, sua base eleitoral. Quer dar explicação pessoal aos seus eleitores. No corpo-a-corpo, espera convencer a maioria de que é inocente.

CULPADO OU NÃO?

Explicações, boas explicações, é tudo que Sônia Mariano Oliveira, auxiliar de expedição da Avon e eleitora de João Paulo em Osasco, quer. A despeito dos testemunhos, ela ainda tem dúvidas. "Eu não acredito que tudo seja verdade. Ficam jogando muita coisa, mas não provam nada. É difícil acreditar que o PT está envolvido, mas fazer o quê? Acontece, não é?"

Pelo menos num ponto João Paulo já começou a agradar a Sônia: ela não quer que os acusados renunciem. "Quem renuncia, igual aquele do PL (Valdemar Costa Neto), está provando sua culpa", diz ela. "Aquele do PL", o ex-deputado Valdemar Costa Neto, provocou desencanto em cadeia em Mogi das Cruzes, município com 445 mil habitantes, a 50 quilômetros de São Paulo, onde pontifica.

Seu pai foi prefeito de Mogi, secretário estadual do governo Paulo Maluf e é muito querido na cidade; Boy, como é conhecido lá, cresceu eleitoralmente na esteira do prestígio paterno. "No pai, votava sempre. No Boy, nunca mais", assevera Manoel Aires de Oliveira, metalúrgico aposentado, eleitor de Valdemar e Lula em 2002, mas que já decidiu votar no governador Geraldo Alckmin para presidente em 2006.

Boy também já está preocupado em mudar a impressão do eleitorado de Mogi. Renunciou e foi patrocinar um churrasco para 300 correligionários, onde começou a se explicar, antecipando que será candidato em 2006 e, naturalmente, conta com o voto de todos. "Ele é generoso nas gorjetas", reconhece Joana d'Arc Lorenzeto, garçonete, que trabalhou em festas promovidas por Boy e serviu bebidas no churrasco. "Mas votar, não sei, vou ter de pensar",

A cozinheira Lúcia Souza de Oliveira, de Santo André, não só votou no Professor Luizinho, como convenceu muita gente a votar nele e no PT. Conhecida na cidade como "petista roxa", ela diz: "A decepção foi muito grande. Tá difícil acreditar que o partido não tem envolvimento. Não creio mais em partido nenhum, são todos iguais", conclui, com desesperança.

Uma desesperança do mesmo porte, mas de qualidade diferente, acomete Idianês Araújo, auxiliar de serviços de uma empresa de informática em Mogi. Ela votou em Boy em 2002, acompanha o noticiário dos escândalos, mas nem com a renúncia mudou o voto. Ela diz que nunca acreditou em políticos. "Eles são todos iguais. Tanto faz votar num ou noutro", conclui.

Márcia Borges, dona de casa em Osasco, conta que votou em João Paulo Cunha por causa do "oba-oba" de amigas. Ela acredita que "o grupo todo de Osasco está envolvido" nas acusações de caixa 2. O grupo de Osasco, explica, é formado pelos petistas João Paulo Cunha, Sílvio Pereira, José Genoino, José Dirceu e o Aloizio Mercadante. "Sempre estavam juntos. Desconfio de todos, principalmente do Zé Dirceu", complementa.

ARREPENDIMENTO

O webdesigner Marcus Vinicius da Silva votou "pelo passado" de Dirceu, "um homem que passava confiança". Agora, se arrepende: "Ele deve prestar contas e não esconder, como aparentemente vem fazendo", diagnostica. E se diz convencido do envolvimento do deputado. "Em todos os depoimentos aparece o nome dele. Impossível não estar por trás disso."

Além de decepcionada, a profissional liberal Marinilza Gimenes Silva diz ter ficado com raiva de ver o nome de seu candidato, Professor Luizinho, entre os acusados do mensalão. Mas não está arrependida. "Achei que, por ter gente nova, o PT traria mudanças. Valeu a pena para ver", diz. Agora, guarda uma convicção: "O PT não é pior que os outros, é igual."

A vendedora Estela Luca também votou em Professor Luizinho porque achava que ele ia ajudar Santo André. "Hoje não votaria novamente." Para ela, a CPI já revelou o suficiente: "Pode não ter provas, mas que tem coisa errada tem." De Lula, Estela cobra: "Esperava um pulso mais forte dele."

O metalúrgico Eugênio Gabriel conheceu Luizinho quando era garçom e o deputado "realmente era professor". Por isso, votou nele em 2002. Ele não acompanha o desenrolar da crise, mas garante: "Se ficar comprovado que ele está envolvido no esquema, não voto nele de novo", diz o metalúrgico, que já sufragou Fernando Collor, Fernando Henrique Cardoso e, finalmente, Lula.

Cabo eleitoral de João Paulo em 2002, o empresário artístico José Pinada Gomes de Moraes diz conhecer o deputado desde que ele era metalúrgico. "Acho que ele sai dessa." Seja qual for o final da crise, Moraes continuará votando no PT e ajudando nas campanhas. "Negociata sempre existiu, e agora o PT está pagando o pato".