Título: Apesar da fala de Lula deixar a desejar, mercados ignoram
Autor: SONIA RACY
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/08/2005, Economia & Negócios, p. B2

A sensação generalizada, captada ontem pela coluna entre empresários e mercado financeiro, é de que o presidente Lula, em seu pronunciamento à Nação, se recusou a aceitar responsabilidade direta pela crise política. E que faltou dar nome aos bois quando disse que foi traído. O mercado financeiro, inclusive, abriu uma bolsa de apostas, quantificando a reação positiva caso o mandato de deputado de José Dirceu seja cassado. A maior média foi a de uma alta de 7% no Ibovespa.

O fato é que a fala de Lula resultou em uma maior volatilidade dos mercados que, sistematicamente, acabam reagindo ao último fato na sincronia da crise política. Curiosamente, as bolsas não reagiram pela lógica óbvia, mostrando decepção por meio de queda de preços. O Ibovespa surpreendeu e subiu, para além dos 26 mil pontos. O dólar, por sua vez, tampouco reagiu à altura. "O presidente Lula deveria acender duas velas: uma para Henrique Meirelles, do BC, que está mantendo a taxa de juros na lua, e outra para o investidor externo, que está aproveitando a oportunidade, dando a sensação de que os mercados estão ignorando a crise política", coloca um banqueiro.

Também foi registrada pelos mercados a posição do secretário-geral do PT, Ricardo Berzoini, que mais uma vez voltou a afirmar que alguns segmentos da oposição estão buscando formas de articular um impeachment do presidente Lula. Na seqüência de declarações da oposição, não há registro dessa vontade. Pelo contrário. Empresários e mercado financeiro, tampouco torcem contra Lula. A ação geral está hoje no sentido de manter Lula na Presidência da República. Quem está atrapalhando o processo são os antigos "aliados" e o próprio PT. Até o vice-presidente José Alencar, que poderia ter algum interesse na piora da situação de Lula, declara a amigos que prefere ficar onde está.

No frigir dos ovos, vale dizer que o discurso do presidente não afastou a crise. Deixou-a praticamente no mesmo nível em que se encontrava anteriormente.

IMPRESSÃO DIGITAL

O discurso do presidente Lula, ontem, com atraso de três horas, não repercutiu bem entre empresários. Cláudio Vaz, do Ciesp, por exemplo, defende que um comandante tem que estar à frente da sua tropa. "Ele está atrás", coloca, apontando que o comportamento de Lula durante seu pronunciamento foi de um analista da atual situação, analista este que expressou seus sentimentos pessoais. "O momento do País precisa de liderança, definição e precisão", defende.

O timing do discurso de Lula também está defasado. "O presidente poderia ter se posicionado dessa maneira há dez dias. A situação, no entanto, mudou."

NA FRENTE

Política

Tanto para o cientista político Bolívar Lamounier bem como para o analista político Murilo Aragão, o discurso veio abaixo das expectativas. "O pedido de desculpas não veio em tom formal ou oficial, mas no tom de uma pessoa esclarecendo conhecidos a respeito de uma situação que o ofendeu", diz Lamounier.

Para Aragão, "o sentimento é que o presidente foi robótico, extremamente protocolar, não disse nada empolgante, pediu desculpas de forma tímida e deixou a impressão de que qualquer um, como, por exemplo, o porta-voz André Singer, poderia ter lido o discurso em seu nome".

Elite

Existe a possibilidade de o presidente Lula aterrissar, segunda-feira, em São Paulo, para jantar em torno de Josué Gomes da Silva, que assume a presidência do Iedi.

Viria com o vice Alencar, pai de Josué.

Olhos

O consultor Clovis Panzarini, ex-coordenador de arrecadação tributária da Fazenda paulista, analisa: o crescimento real da arrecadação, divulgado ontem pela RF, foi de 6,09%. Como o aumento do PIB certamente chegará à metade disso, isso significa forte crescimento da carga tributária.

Destaca também que, se o PIB cresce por conta de exportações - que não são tributadas -, se pode ter uma carga tributária total em queda, mas uma carga interna em alta.

Suor físico

Os atletas Vanderlei Cordeiro de Lima, medalha de bronze em Atenas, e Marilson Gomes dos Santos, vencedor da São Silvestre, vão participar do segundo Congresso de Derivativos, da BM&F, em Campos do Jordão. Puxam prova de 5 km sábado, dia 27, no encerramento do evento.

Na avaliação do mercado financeiro, após o estresse das últimas semanas, vai ser moleza acompanhá-los.

Comparação

Prova de que o estresse dos mercados ante a atual crise ainda é superficial. Em 92, quando do processo de impeachment do presidente Fernando Collor, a BM&F chegou a negociar 9,7 toneladas de ouro em um dia.

Na quinta-feira, os negócios não superaram os 28 quilos.

Da vida

Com toda essa confusão política, a falência do Banco Santos saiu de foco, para alegria de Edemar Cid Ferreira.

Os credores estão tendo grandes dificuldades de navegar pela Lei de Falências.