Título: BC favoreceu alta do dólar
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Fonte: O Estado de São Paulo, 13/08/2005, Economia & Negócios, p. B2

Ontem, o dólar fechou em R$ 2,374, com aumento de 1,19%. Na véspera tinha fechado em R$ 2,346, com alta de 2,89%. Em parte, essa alta reflete os acontecimentos políticos de ontem e antes de ontem e, em parte, foi provocada pelo próprio Banco Central (BC), com uma intervenção cuja justificativa ainda é bastante nebulosa. Mostra, porém, que a economia, até agora blindada diante da crise, poderá ser afetada por novos e mais graves fatos. Já se sabia que, depois da aprovação, pelo Senado, de um salário mínimo de R$ 384,29 e das declarações de Duda Mendonça, primeiro na Polícia Federal, na véspera, e depois na CPI, o efeito seria uma alta do dólar. O que não se previa é que o BC iria escolher justamente esse momento para anunciar um leilão de compra da moeda norte-americana. De fato, dois dias antes, o diretor do Tesouro Nacional, Joaquim Levy, havia declarado que não existia pressa de comprar dólares no mercado. Normalmente, essas compras, realizadas para enfrentar vencimentos sem afetar o nível de reservas, são realizadas pelo próprio Tesouro.

O leilão do BC acabou frustrado, pois o banco se mostrava disposto a pagar R$ 2,298, enquanto as propostas variaram entre R$ 2,325 e R$ 2,350. Segundo se comenta no mercado, o BC realizou algumas compras fora do leilão, cujo montante será conhecido só daqui a 15 dias.

As razões que levaram o BC a, indiretamente, ter contribuído para a alta do dólar, que já era prevista, continuam sem explicações. O BC sabia que o depoimento de Duda Mendonça teria efeito altista. Poderia ter evitado que fosse tão forte, embora esteja interessado, como pensa o mercado, em defender um piso de R$ 2,30 por dólar, uma vez que a valorização do real ante a moeda norte-americana já preencheu seu papel na contenção das pressões inflacionistas, ao passo que é conveniente oferecer aos exportadores uma taxa cambial menos valorizada para consolidar o sucesso que o Brasil tem tido nas suas exportações, e melhor proteger alguns setores industriais que começam a pedir aumento das tarifas alfandegárias.

Convém lembrar que, graças ao aumento das exportações e à redução das importações, os saldos positivos em dólares continuam elevados, de modo que a valorização da moeda nacional deverá se manter. O mercado acredita que no final do mês a cotação (mediana) deverá ficar em R$ 2,35 e que, para o final o ano, chegará a R$ 2,475. É um nível que não deverá provocar nenhum efeito altista na inflação.

Esperemos que essa elevação momentânea do dólar não sirva de justificativa, na reunião do Copom dos dias 16 e 17 de agosto, para adiar mais uma vez uma redução da taxa Selic, que, na realidade, é um fator que também tem contribuído para a valorização do real em relação ao dólar.