Título: Confiança do consumidor despenca
Autor: Marcelo Rehder
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/08/2005, Economia & Negócios, p. B3

O Índice de Confiança do Consumidor (ICC), usado pelo varejo paulista para medir a trajetória das vendas, despencou na última semana para o menor nível desde 1994, quando começou a ser divulgado. O indicador ficou em 106,8 pontos, numa escala que vai de 0 (pessimismo total) a 200 (otimismo total), o que representou queda de 19,9% na comparação com a mesma semana de julho. A pesquisa foi feita com 400 consumidores na cidade de São Paulo, ouvidos na sexta-feira, um dia depois do depoimento do publicitário Duda Mendonça à CPI dos Correios, quando ele confirmou a existência de caixa 2 nas campanhas eleitorais do PT, e no mesmo dia em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um pronunciamento à Nação. Nesse discurso, Lula disse que o PT e o governo deviam pedir perdão à população, mas isso foi considerado insuficiente até mesmo por lideranças do seu próprio partido.

"Nunca tivemos uma queda tão brusca em tão curto espaço de tempo", diz o economista Antônio Carlos Borges, diretor-executivo da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomércio-SP), responsável pela sondagem.

O resultado da pesquisa da semana passada já mostra uma piora sensível das expectativas que vigoraram até o início de agosto. O índice mensal, cuja coleta foi feita antes do depoimento de Duda Mendonça e envolveu cerca de mil consumidores, caiu 5,4% na comparação com julho, atingindo 126,1 pontos - o menor dos últimos 12 meses.

A pesquisa indica ainda uma mudança radical de tendências. Até o início do mês os consumidores estavam animados com as condições econômicas atuais, embora se mostrassem preocupados com a expectativa futura. Na semana passada, o índice das condições futuras caiu 22,1%, em relação ao mesmo período de julho, e o índice de expectativas recuou 18,4%.

A queda na confiança do consumidor é generalizada por segmentos de renda, sexo e idade. No entanto, o maior recuo, de 28%, foi registrada entre os consumidores com renda mensal inferior a 10 salários mínimos. O índice de confiança da classe média recuou 4,4%.

A conseqüência disso deverá vir com um aumento da cautela do varejo. "O lojista olha atento para essas coisas, fica na expectativa de que a demanda será menor que a esperada e se acautela quanto a estoques e encomendas à indústria."

Grandes redes de varejo de eletroeletrônicos começam a sentir os efeitos da queda da confiança do consumidor. Nos primeiros 16 dias deste mês, o faturamento das Lojas Cem ficou praticamente empatado com o de igual período de 2004, já descontados a inflação e o aumento de receitas com a abertura de 15 novas lojas. Hoje, a rede tem 145 pontos-de-venda espalhados pelo País. No primeiro semestre, houve crescimento real de 5%.

"Era justo esperar que agosto desse, no mínimo, esse crescimento de 5%", diz Valdemir Colleone, supervisor-geral das Lojas Cem. "Como o melhor período para as vendas já passou (o Dia dos Pais), a tendência é agosto fechar com queda no faturamento real".

Na avaliação de Colleone, o resultado abaixo do esperado reflete principalmente os desdobramentos da crise política, já que outros fatores negativos, como os juros altos, o nível elevado de desemprego e a renda estagnada, já existiam. "Um componente que precisa ser considerado também é o fato de que as pessoas hoje estão mais endividadas do que nunca, o que tira um pouco do potencial de consumo".

Outro indicador da cautela do consumidor é o aumento da poupança. Em julho, a caderneta de poupança teve a primeira captação líquida positiva do ano. Depois de perder R$ 5,6 bilhões no primeiro semestre, o resultado do mês ficou positivo em R$ 675,66 milhões, segundo o Banco Central (BC). Os depósitos somaram R$ 56,882 bilhões, ante saques de R$ 56,2 bilhões. A captação líquida é medida pela diferença entre os depósitos e as retiradas.

Levantamento divulgado ontem pela Associação Comercial de São Paulo indica que o varejo na cidade continuou com expansão nas vendas, embora num ritmo menor. Na primeira quinzena do mês, as consultas ao Serviço de Proteção ao Crédito (SPC), termômetro das vendas a prazo, cresceu 12,8% na comparação com o mesmo período de 2004. As chamadas ao Telecheque, que medem a evolução das vendas à vista ou com cheques pré-datados, aumentaram 8,6%. Como este ano teve um dia útil a mais na primeira quinzena, o crescimento da média diária é mais modesto: de 6% e 3,2%, respectivamente.