Título: Para CNBB, só desculpa não basta
Autor: José Maria Mayrink
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/08/2005, Nacional, p. A11

D. Jayme, que falou pela presidência da conferência, cobra "medidas concretas contra a corrupção para acalmar o País"

INDAIATUBA - O bispo de Pelotas (RS), d. Jayme Chemello, disse ontem, depois de assistir ao pronunciamento do presidente da República pela televisão, que "Lula teve coragem de pedir desculpas ao povo brasileiro, mas isso não basta, pois é preciso tomar medidas concretas contra a corrupção para acalmar o País". D. Jayme, que participa da 43.ª Assembléia-Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) em Itaici, no município paulista de Indaiatuba, anunciou que ia convidar os bispos a passar uma hora de joelhos diante do Santíssimo Sacramento hoje, dia de retiro espiritual, para pedir a Deus mais ética para os governantes do País.

"O Executivo, o Legislativo e o Judiciário precisam ter mais ética, de modo que não coloquem o dinheiro acima de tudo, porque o dinheiro foi sempre um grande perigo ao longo da história, até para padres e bispos", disse d. Jayme. Como presidente da CNBB, ele recebeu o presidente Lula em Itaici, em 2003, quatro meses após sua posse no governo.

Em resposta a um jornalista na entrevista coletiva em que falava em nome da presidência da CNBB, d. Jayme disse ser impossível prever se a crise política levaria ao impeachment de Lula. "Só Deus sabe, pois vai depender da reação dos partidos. Acho que talvez não seja o caso de impeachment. Depende também de o País se acalmar após toda essa crise."

Para o bispo de São Carlos (SP), d. Joviano de Lima Júnior, "o impeachment deveria ser o último recurso, só se houvesse grande evidência dos fatos". O processo de apuração das denúncias de corrupção, disse ele, tem de ser um momento de purificação, "para resgate da cidadania e para uma transformação social."

"Meu desejo é que não venha a ocorrer o impeachment, para que se salve o projeto proposto por Lula ao assumir o governo", reforçou o bispo de Chapecó (SC), d. Manoel João Francisco, que participou da entrevista ao lado de d. Jayme e de d. Joviano. Os bispos interromperam o almoço, que começa religiosamente às12h30, para assistir ao discurso do presidente.

O bispo de Petrópolis (RJ), d. Filippo Santoro, disse ao Estado que, apesar "de a ética ter sido violada de forma espantosa, o povo brasileiro não pode desanimar". "Caiu a bandeira da ética do PT, mas de forma alguma caiu a bandeira da esperança, que depende do valor indestrutível da consciência pessoal, aberta ao bem e contrária ao mal."

Depois de lembrar que uma parte da Igreja apoiou o projeto ideológico do PT, d. Filippo - italiano de Bari, há mais de 20 anos no Brasil, foi bispo auxiliar do cardeal d. Eugenio Sales, no Rio - lamenta que dois anos de poder tenham revelado que muitos líderes do partido "não são puros e caíram nos mesmos erros do poder burguês que violentamente atacavam".

O presidente do Rabinato da Congregação Israelita Paulista, rabino Henry Sobel, vai participar, às 18 horas de segunda-feira, de um culto inter-religioso no convento de Itaici, para protestar contra a corrupção. "Ao lado da monja Cohen, budista, vou me unir ao cardeal de São Paulo, d. Cláudio Hummes, e aos demais bispos brasileiros para pedir a Deus que acabe com a corrupção no governo."

O porta-voz da presidência da CNBB, padre Valdir José de Castro, informou que o presidente da entidade, cardeal Geraldo Majella Agnelo, respondeu na quinta-feira à carta enviada por Lula ao episcopado, em seu nome, na abertura da assembléia de Itaici. "O cardeal não divulgará o texto, porque essa iniciativa compete ao destinatário, que é o presidente da República", disse. A CNBB não revelou nada sobre o conteúdo da carta.