Título: O discurso de Lula
Autor: Tânia Monteiro, Leonencio Nossa
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/08/2005, Nacional, p. A4

"Meus amigos, Minhas amigas. Boa tarde, meu querido companheiro José Alencar, vice-presidente da República e ministro da Defesa, minhas companheiras ministras e ministros, que participam desta reunião. Fiz questão de que as minhas palavras neste encontro de trabalho fossem abertas à população brasileira. Temos assuntos importantes a discutir que dizem respeito a toda sociedade. Mas, antes de mais nada, quero saudar em especial os novos ministros que vêm reforçar a nossa capacidade de ação nesta segunda metade do meu mandato. Vocês estão entrando num governo que, apesar de todas as dificuldades, fez o Brasil retomar o caminho do progresso e da justiça social.

Voltamos a crescer, mas desta vez de maneira sustentável, com a inflação baixa e, o que é mais importante, gerando milhões de empregos no campo e nas cidades. Tenho certeza de que o povo sente a diferença, o País está mudando para melhor.

A inflação é a menor dos últimos cinco anos, a produção industrial registra aumentos sucessivos. Na balança comercial, as exportações ultrapassam a casa dos US$ 110 bilhões nos últimos doze meses. É o melhor resultado da nossa história.

Mas o que mais me orgulha, pela minha história e pelo compromisso que tenho com a gente humilde da nossa terra, é a forte retomada da oferta de trabalho. Em 30 meses, já criamos 3 milhões, 135 mil novos empregos com carteira assinada. Isso significa 104 mil novas vagas formais por mês, 12 vezes mais que a média dos anos 90, sem falar nos postos de trabalho no mercado informal e na agricultura familiar. Criamos um ambiente favorável para a volta dos investimentos. Projetos no valor de mais de US$ 20 bilhões já estão programados para entrar em operação na nossa economia.

Novas frentes de expansão em energia elétrica, transportes, novas fábricas e construções fizeram a produção de bens de capital crescer 10% nos últimos dois meses. Na área social, 7 milhões e 500 mil famílias de brasileiros mais humildes têm garantido o acesso a uma renda mínima através do programa Bolsa-Família. Até o final do ano, 8 milhões e 700 mil lares serão beneficiados pelo programa.

Uma revolução está em marcha no mercado de consumo popular no nosso país. Expandimos o crédito com desconto em folha e muitos trabalhadores puderam pagar as suas dívidas e comprar uma geladeira, um fogão ou outro bem desejado por suas famílias.

Por isso, as vendas nesse setor cresceram 21% no segundo trimestre, comparado ao mesmo período de 2004. Este país não pode parar. Tenho certeza de que este é o desejo da sociedade brasileira.

Companheiros, ministros e ministras, estou consciente da gravidade da crise política. Ela compromete todo o sistema partidário brasileiro. Em 1980, no início da redemocratização, decidi criar um partido novo que viesse para mudar as práticas políticas, moralizá-las e tornar cada vez mais limpa a disputa eleitoral no nosso país.

Ajudei a criar esse partido e, vocês sabem, perdi três eleições presidenciais e ganhei a quarta, mantendo-me sempre fiel a esses ideais, tão fiel quanto sou hoje. Quero dizer a vocês, com toda a franqueza, eu me sinto traído. Traído por práticas inaceitáveis das quais nunca tive conhecimento. Estou indignado pelas revelações que aparecem a cada dia, e que chocam o país. O PT foi criado justamente para fortalecer a ética na política e lutar ao lado do povo pobre e das camadas médias do nosso país. Eu não mudei e, tenho certeza, a mesma indignação que sinto é compartilhada pela grande maioria de todos aqueles que nos acompanharam nessa trajetória.

Mas não é só. Esta é a indignação que qualquer cidadão honesto deve estar sentindo hoje diante da grave crise política. Se estivesse ao meu alcance, já teria identificado e punido exemplarmente os responsáveis por esta situação. Por ser o primeiro mandatário da Nação, tenho o dever de zelar pelo Estado de Direito. O Brasil tem instituições democráticas sólidas. O Congresso está cumprindo com a sua parte, o Judiciário está cumprindo com a parte dele. Meu governo, com as ações da Polícia Federal, está investigando a fundo todas as denúncias. Determinei, desde o início, que ninguém fosse poupado, pertença ao meu partido ou não, seja aliado ou da oposição. Grande parte do que foi descoberto até agora veio das investigações da Polícia Federal.

E vamos continuar assim até o fim, até que todos os culpados sejam responsabilizados e entregues à Justiça. Mesmo sem prejulgá-los, afastei imediatamente os que foram mencionados em possível desvio de conduta para facilitar todas as investigações. Mas isso só não basta. O Brasil precisa corrigir as distorções do seu sistema partidário eleitoral, fazendo urgentemente a tão sonhada reforma política. É necessário punir corruptos e corruptores, mas também tomar medidas drásticas para evitar que essa situação continue a se repetir no futuro.

Quero dizer aos ministros que é obrigação do governo, da oposição, dos empresários, dos trabalhadores e de toda a sociedade brasileira não permitir que esta crise política possa trazer problema para a economia brasileira, para o crescimento deste país, para a geração de empregos e para a continuidade dos programas sociais. Temos que arregaçar as mangas e redobrar esforços. Peço que aumentem, ainda mais, a sua dedicação. Se atualmente vocês, ministros e ministras, trabalham até 11 horas da noite, trabalhem um pouco mais, até meia-noite, uma hora da manhã, porque nós sabemos que muito já fizemos, mas muito mais temos que fazer, porque o Brasil precisa de nós."

IMPROVISO: "Queria, neste final, dizer ao povo brasileiro que eu não tenho nenhuma vergonha de dizer ao povo brasileiro que nós temos que pedir desculpas. O PT tem que pedir desculpas. O governo, onde errou, tem que pedir desculpas, porque o povo brasileiro, que tem esperança, que acredita no Brasil e que sonha com um Brasil com economia forte, com crescimento econômico e distribuição de renda, não pode, em momento algum, estar satisfeito com a situação que o nosso país está vivendo.

Quero dizer a vocês: não percam a esperança. Eu sei que vocês estão indignados e eu, certamente, estou tão ou mais indignado do que qualquer brasileiro. E nós iremos conseguir fazer com que o Brasil consiga continuar andando para frente, marchando para o desenvolvimento, para o crescimento da riqueza e para a distribuição de renda. E eu tenho certeza que posso contar com o povo brasileiro. Muito obrigado."