Título: Instabilidade tira sono de empresários
Autor: Nicola Pamplona
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/08/2005, Economia & Negócios, p. B1

RIO - Com um olho nos negócios e outro em Brasília, empresários brasileiros estão mais preocupados com os efeitos da crise política no mercado financeiro e nas ações do governo federal do que com o futuro do governo do PT. O Brasil tem instituições fortes e vai sobreviver a qualquer desfecho político, dizem executivos ouvidos pelo Estado, e as atenções estão voltadas para a volatilidade dos mercados e a paralisia no Executivo e no Congresso. "Um dia o dólar cai; no outro sobe porque apareceu mais uma denúncia, ou porque o Delúbio foi à CPI. É difícil fazer previsões", diz o presidente da Marcopolo, José Rubens de la Rosa, sintetizando um sentimento comum entre os entrevistados. "É nesse sentido que a crise nos afeta", afirma.

A questão foi bem ilustrada pelos acontecimentos de sexta-feira quando, após as denúncias feitas por Rogério Buratti, ex-assessor do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, a moeda americana disparou e fechou o dia em alta de 2,9%.

A Marcopolo tem motivos de sobra para se preocupar com o câmbio: no segundo trimestre deste ano, 52,3% de suas vendas foram feitas no mercado externo. Qualquer variação na cotação da moeda americana, portanto, tem impacto significativo em sua receita. As previsões da empresa, dessa forma, ficam à mercê das variações do mercado cambial. A questão também é citada pelo vice-presidente do Grupo Cataguases-Leopoldina, que opera no setor de energia, Ricardo Botelho. "O setor elétrico está mais ou menos blindado contra a crise, porque tem regulação, mas as oscilações do câmbio podem provocar problemas", avalia o executivo. O setor elétrico é altamente endividado em dólar e apresentou bons resultados este ano por causa da valorização do real.

O aspecto regulatório que alivia as companhias elétricas, por outro lado, é motivo de insônia em outros setores. A situação se complica ainda mais por causa da paralisia que assola a classe política, mais preocupada com as CPIs do que com a elaboração de leis. "A crise política não vem nos afetando diretamente, mas o andamento de alguns projetos no Legislativo ficou engasgado", opina o presidente do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Gás Liquefeito de Petróleo (GLP), o gás de cozinha, Sérgio Bandeira de Mello.

Ele cita como exemplo a demora na nomeação de duas diretorias na Agência Nacional do Petróleo (ANP), vagas desde o início do ano. A direção-geral da autarquia é ocupada interinamente por Haroldo Lima desde a saída de Sebastião do Rego Barros, em janeiro. O governo tentou emplacar o professor José Fantine no cargo, mas foi derrotado no Senado. Agora, a avaliação geral é de que não há clima para avaliar um novo nome enquanto perdurar a crise.

O setor de gás natural observa a situação política com muito mais apreensão. A nova lei do gás já começou a ser discutida em Brasília, mas, outra vez, não se sabe se haverá clima para votação no Congresso. A regulamentação do mercado de gás é considerada essencial para garantir a segurança dos investimentos privados à véspera de mais um leilão de áreas exploratórias no País.

"O governo ainda não conseguiu emplacar nem as PPPs (Parcerias Público-Privadas), que estão em discussão há muito tempo; o que se pode esperar das negociações sobre a lei do gás?", questiona um executivo de uma empresa multinacional que pediu para não ser identificado.

No início da semana, em evento em São Paulo, o ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, pediu a empresários que não se deixassem levar pelas emoções da crise política e mantivessem seus projetos de investimento, ressaltando que os indicadores econômicos brasileiros são positivos.

Para o presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Guido Mantega, as turbulências em Brasília ainda não bateram às portas do banco, um dos termômetros do apetite dos investidores. Em entrevista na última semana, ele disse que o banco prevê crescimento de 20% a 25% nos desembolsos em 2005. Mas a preocupação do governo é que o desânimo já verificado em pesquisas de confiança do consumidor contamine o empresariado.

"A crise política é passageira e nosso mercado é crescente", diz a investidores no Rio o diretor financeiro do Grupo Suzano, João Nogueira Batista, após anunciar a manutenção de planos de investimento em expansão da capacidade produtiva. A empresa planeja investir nas unidades de Mauá e Duque de Caxias da Polibrasil, empresa cujo controle foi adquirido recentemente. "As decisões de investimento estão acima das turbulências de curto prazo", reforça o executivo, destacando que são projetos de longo prazo, com o objetivo de resolver alguns gargalos previstos no mercado de resinas.

Empresas grandes como a Suzano, com mercado internacional para seus produtos, tendem a sentir menos as turbulências. Mas quem depende do dinheiro das classes mais baixas está ressabiado.

"A crise nos atrapalha à medida em que paralisa investimentos, principalmente em infra-estrutura, e reduz a geração de novos empregos", contrapõe o presidente da Eternit, Élcio Martins.

Fabricante de telhas e caixas d¿água de amianto, a empresa tem a população de baixa renda entre seus principais clientes.