Título: Palmeira critica métodos do `amigo-adversário¿
Autor: Guilherme Evelin
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/08/2005, Nacional, p. A8

Entre os 15 passageiros do Hércules 2456, Vladimir Palmeira foi o companheiro mais próximo de Dirceu, mas também o que mais teve divergências políticas com ele. No movimento estudantil, os dois rivalizavam na disputa de quem era o mais carismático. O seqüestro de Elbrick foi organizado com o objetivo inicial de tirá-los da cadeia, onde estavam desde o congresso clandestino da União Nacional dos Estudantes (UNE) em 1968, em Ibiúna (SP). De volta do exílio e juntos no PT, os dois tiveram desavenças sérias. Em 1998, Dirceu, no comando nacional do partido, fez uma intervenção no Rio de Janeiro e impediu a candidatura de Palmeira ao governo estadual para impor uma aliança com Anthony Garotinho, em nome de um acordo nacional com o PDT. O episódio causou entre os petistas um trauma interno profundo. Desde então, Palmeira trata Dirceu como "adversário político", mas os dois continuam amigos e a se encontrar socialmente - na última quarta-feira, jantaram juntos no apartamento do ex-chefe da Casa Civil em Brasília.

Qualquer tentativa de arrancar de Palmeira ataques pessoais a Dirceu é condenada ao fracasso, embora ele faça críticas ferinas aos métodos políticos do amigo-adversário. Uma delas é ao "poder tecnocrático, no modelo da prefeitura de Santo André " que Dirceu instituiu no partido. Para Palmeira, essa é a causa estrutural da ruína petista. "A divisão principal do PT não era entre direita e esquerda, mas entre quem defendia um poder democrático, simbolizado pela administração do partido em Porto Alegre, aberta aos movimentos sociais, e o poder tecnocrático, simbolizado pela administração em Santo André. O partido optou pelo poder ao estilo de Santo André", diz Palmeira.

"MODELO PAULISTA"

Outro ataque é à exportação para outros Estados do "modelo paulista", de tudo ser resolvido pela direção e sem discussão com a militância. "A partir dos anos 90, 75% dos delegados aos congressos do PT passaram a ser funcionários pagos, ou do partido, ou dos parlamentares, ou dos sindicatos. Isso afastou o PT dos movimentos de massa e da vigilância e da crítica", critica Palmeira. Tudo isso seria natural, ele reconhece, se o PT, mesmo se tornando um partido convencional, tivesse mantido um certa "postura". "O chocante é a dimensão dos fatos. Todos os partidos têm caixa 2, mas o PT, nesse aspecto, quis também se tornar vanguarda em relação aos demais", alfineta.

Palmeira evita, porém, responsabilizar exclusivamente o velho companheiro por esses desvios. "Não acredito em diabo. O Campo Majoritário (o grupo que controla o PT) é formado por um bando de gente. E o José Dirceu sempre foi o operador político do Lula", lembra.

Ele foi lançado pela esquerda petista como pré-candidato do partido ao governo do Rio em 2006. Mas não quer obter a candidatura, a qualquer preço, como uma forma de ir à forra contra Dirceu. "Minha candidatura depende também do que vai ser decidido pela direção nacional do partido. O PT precisa punir", avisa Palmeira. " Se o Campo Majoritário continuar resistindo a abrir até a investigação na Comissão de Ética, o PT vai se tornar um partido médio e não disputará mais a hegemonia na sociedade."