Título: Palocci deve garantir dia mais calmo
Autor: Mariana Barbosa, Francisco Carlos de Assis, Renato
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/08/2005, Economia & Negócios, p. B1

Maioria dos analistas ficou satisfeita com explicações de ministro, mas acredita que é preciso muito mais para conter turbulência

O pronunciamento do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, negando ontem com veemência as denúncias de corrupção feitas por seu ex-assessor Rogério Buratti na sexta-feira, deve deixar o mercado mais tranqüilo hoje, mas não o suficiente para pôr de lado as turbulências. ¿Palocci foi perfeito, agiu rápido, falou sem precisar ficar consultando advogados, respondeu às perguntas em detalhes¿, avalia o analista Marcelo Ribeiro, da consultoria Pentágono. ¿Mas o clima de tensão não se extingue aí. O governo está muito fragilizado e a economia não está blindada.¿ Apesar de reconhecer que os fundamentos da economia brasileira nunca foram tão sólidos, Ribeiro afirma que a situação só se mantém relativamente equilibrada devido à liquidez no mercado internacional. ¿Se por um lado a economia nunca esteve tão bem, por outro nunca tivemos um governo e um Congresso tão bombardeados com denúncias de corrupção¿, diz ele. ¿Temos de cruzar os dedos para que esse processo chegue ao fim enquanto o cenário externo ainda estiver favorável.¿

O economista-sênior do banco WestLB, Adauto Lima, também acredita que a reação do mercado financeiro à entrevista de Palocci deve ser positiva hoje no início dos negócios. ¿É natural que um ou outro agente econômico mantenha, no decorrer da próxima semana, um certo grau de cautela, mas nada que possa agregar muita volatilidade ao mercado, graças à atitude de Palocci de vir a público esclarecer os fatos.¿ Para o ex-ministro da Fazenda e consultor Mailson da Nóbrega, Palocci foi bastante ¿convincente¿. ¿Ele desmontou com firmeza e tranqüilidade todas as acusações que pesavam sobre ele¿, salientou. ¿Palocci deu a volta por cima e mostrou mais uma vez que é o destaque, o ponto fora da curva do governo Lula.¿

O economista da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), Roberto Troster, também acredita que o mercado deve ¿continuar nervoso, embora mais otimista¿. A principal mensagem passada por Palocci, e que servirá, na sua avaliação, para acalmar os mercados, foi a de que a política econômica independe de pessoas. ¿Ele deixou claro que a atual política não é dele, mas sim do governo e que não vai haver mudanças, aconteça o que acontecer¿, disse Troster. O economista acredita que as declarações do ministro foram suficientes para compensar o depoimento de Buratti. Troster destaca ainda que a atitude de Palocci ¿ de se prontificar a responder tudo, com transparência ¿ deveria ser adotada como padrão pelo governo Lula.

Diversos analistas notaram que a atitude de Palocci criou um contraste muito grande com aquela de outros integrantes do governo, incluindo o próprio presidente. ¿O presidente é a Velhinha de Taubaté¿, criticou o presidente da Associação Nacional de Investidores do Mercado de Capitais, Waldir Corrêa, citando a personagem, criada pelo escritor Luís Fernando Veríssimo, incapaz de enxergar maldade no mundo. ¿Está faltando liderança, um estadista que venha a público explicar tudo o que está acontecendo, quem são os traidores. Se não, a cada semana é uma novela.¿

Há um certo consenso no mercado financeiro de que os fundamentos da economia são sólidos o suficiente para contornar uma eventual saída de Palocci, mas essa opinião não é unânime. ¿O medo não é o de Palocci cair, mas uma eventual mudança de política econômica. Um enfraquecimento do ministro poderia ter conseqüências para a política fiscal¿, diz um analista que prefere não se identificar. ¿Mas, ironicamente, o Lula está mais amarrado a essa política econômica agora do que nunca. Essa é a única coisa que sustenta o governo.¿ Na visão do economista Luiz Carlos Costa Rego, da consultoria Costa Rego & Associados, a reação do mercado na sexta-feira demonstra que os fundamentos da economia não estão plenamente solidificados. Naquele dia, o dólar fechou cotado em R$ 2,45, subindo 2,90%, a maior alta desde 31 de maio de 2004. O risco país aumentou 3,45% e atingiu 420 pontos, enquanto a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) caiu 0,95%.

Na avaliação do consultor, o setor externo só está apresentando desempenho surpreendente porque a China ¿está comprando tudo o que tem no mundo¿ e a inflação brasileira só está convergindo para a meta pela primeira vez em três anos porque os juros altos pressionaram o preço do dólar para baixo. Para Costa Rego, o mercado só deverá abrir ¿sem stress¿ hoje pois investidores estão conscientes de que Buratti não tem provas para sustentar as acusações.