Título: Stiglitz: 'Não há razão para a crise chegar à economia'
Autor: Patrícia Campos Mello e Silvana Rocha
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/08/2005, Economia & Negócios, p. B1

O Prêmio Nobel de Economia Joseph Stiglitz acredita que os mercados financeiros não querem se preocupar com a crise política no Brasil porque têm interesse na preservação da estabilidade. Ao falar a empresários a convite do Banco Bladex, o economista afirmou que não há razão para que a turbulência contamine a economia porque o Brasil tem hoje instituições econômicas mais fortes que no passado. Ele admitiu, no entanto, que "tudo pode mudar" porque os desdobramentos da crise são incertos e o cenário pode passar por transformações num curto espaço de tempo. Para Stiglitz, esse é o preço que um País aberto ao fluxo de capitais externos paga pela exposição. Assim, os mercados se movem não apenas pela percepção interna, mas também pela externa, o que inevitavelmente leva a um grau de incerteza maior.

Ele citou a crise de confiança por que passou o Brasil em 2002, durante o processo eleitoral. Naquele ano, a percepção dos mercados de possíveis mudanças na política econômica levou à fuga de capitais e deterioração dos indicadores.

Nesse sentido, Stiglitz ponderou que o governo Lula tinha duas opções de estratégia. Na primeira, optaria pela ortodoxia, tentando convencer os mercados de sua escolha, o que faria com que as taxas de juros levassem mais tempo para cair. Essa alternativa traria fluxo de capitais e permitiria o cumprimento de uma agenda política e social no longo prazo.

A outra alternativa seria mais agressiva, com mudanças econômicas que poderiam limitar a dependência do Brasil ao capital externo. Embora pudesse causar uma reação forte no curto prazo, essa hipótese faria com o Brasil estivesse menos dependente do capital externo. "Ninguém saberia dizer qual a melhor; ambas seriam arriscadas. O governo optou pela primeira", afirmou, ponderando que essa alternativa está demorando para levar à queda dos juros.

Como contraponto, ele citou que a economia brasileira foi beneficiada pela alta do preço das commodities no mercado internacional. Agora, ponderou, é preciso acompanhar para saber quão forte é a confiança dos mercados no Brasil neste momento "em que as coisas podem ficar piores, ao invés de melhores".

Stiglitz atribuiu as altas dos juros no Brasil à política de metas de inflação e, particularmente, à sua rigidez. Segundo ele, a condução da política põe toda a responsabilidade nos juros para que se atinjam a meta. Nesse sentido, ele disse que se estabeleceu um círculo vicioso, em que, quanto mais altos forem os juros, maior é a necessidade de empréstimos por parte do governo, o que faz com que as taxas se mantenham altas.

Ao criticar o Consenso de Washington, Stiglitz disse que o controle da inflação não pode ser um objetivo em si mesmo.