Título: SP contribui para o efeito estufa como se fosse 1.º mundo
Autor: Herton Escobar
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/08/2005, Vida&, p. A24

O preço ambiental que São Paulo paga por sua frota de mais de 5 milhões de veículos particulares não pesa mais apenas no bolso e nos pulmões dos paulistanos. Acima da camada negra de poluição do ar urbana, os escapamentos da cidade também contribuem para entupir a atmosfera do planeta com dióxido de carbono (CO2), principal gás envolvido no aquecimento global. Segundo dados inéditos do Inventário de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Município de São Paulo, a cidade emite cerca de 16 milhões de toneladas de CO2 por ano, das quais quase 50% provenientes apenas da queima de gasolina e óleo diesel no transporte. O levantamento, divulgado ontem, foi feito por uma equipe especializada da Coordenação dos Programas de Pós-graduação de Engenharia (Coppe) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em convênio com a Prefeitura de São Paulo. Todos os dados referem-se a 2003 e incluem as emissões de CO2 e CH4 (metano), os dois principais gases do efeito estufa. A idéia é que, com o mapeamento em mãos, a cidade possa desenvolver estratégias para a redução de suas emissões. "O inventário é apenas o retrato de uma situação no tempo. Mas, a partir do momento em que você conhece as fontes e a responsabilidade de cada uma, é possível intervir de maneira específica", explica Carolina Dubeux, coordenadora executiva do inventário e pesquisadora do Centro Clima da Coppe.

Com quase 11 milhões de habitantes, São Paulo segue o padrão dos países industrializados, com a maior parte de suas emissões centrada no setor energético (76%), que inclui a queima de combustíveis fósseis (gasolina, gás e óleo diesel). Em segundo lugar vêm as emissões da decomposição de matéria orgânica nos dois lixões municipais, com mais de 23%. E em terceiro, bem distante, a perda de cobertura vegetal e mudanças no uso do solo, com 0,33%.

No cenário nacional observa-se o padrão inverso, com 75% das emissões provenientes do desmatamento e 25%, do setor energético. De acordo com o inventário brasileiro, o País emite anualmente cerca de 1,3 bilhão de toneladas de CO2. Mas há uma observação importante: os números do levantamento nacional estão defasados quase dez anos em relação aos do municipal. O inventário brasileiro refere-se às emissões de 1994, o que torna arriscado fazer comparações numéricas entre os dois relatórios.

A mesma equipe da UFRJ publicou em 2000 o inventário de emissões da cidade do Rio, com base no ano de 1998. Uma comparação per capita mostra que o cidadão paulistano emite 1,47 tonelada de CO2 por ano, ante 2,27 toneladas emitidas por cidadão carioca. Nesse caso também, entretanto, é preciso considerar a diferença de tempo. "Isso não significa que São Paulo esteja melhor do que o Rio. Há inúmeras variáveis que podem contribuir para essa diferença", explica Carolina. "Se fizéssemos uma comparação no mesmo ano, os números seriam provavelmente muito semelhantes."

SOLUÇÕES

O próximo passo do projeto consiste na construção de cenários sobre a evolução das emissões para os próximos anos e na avaliação de políticas públicas para a redução dessas emissões. No setor de transportes, especialistas concordam que a melhor solução é a expansão do transporte coletivo e o uso de combustíveis menos poluentes, como o gás e o álcool.

Entre as propostas já estudadas pela Secretaria do Verde e do Meio Ambiente estão a recuperação da frota de trólebus e o incentivo ao uso de bicicletas por meio de ciclovias. "São Paulo é uma cidade americana do ponto de vista do transporte", disse ao Estado o secretário municipal do Meio Ambiente, Eduardo Jorge. "Precisamos reorientar nosso modelo de forma que o meio de transporte coletivo seja o determinante, em vez do transporte particular. E isso implica uma mudança de hábito muito significativa."

No caso dos aterros sanitários, a solução é a queima do gás metano, que pode ser aproveitado na produção de energia elétrica. O aterro Bandeirantes, em 2003, já queimava 20% do metano produzido pela decomposição de aproximadamente 30 milhões de toneladas de lixo. E um projeto semelhante está em licitação para o aterro São João. "Nesse aspecto São Paulo tem tido uma atitude exemplar", avalia Carolina.