Título: Retirada forçada começa sem luta
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Fonte: O Estado de São Paulo, 18/08/2005, Internacional, p. A18

NEVE DEKALIM, FAIXA DE GAZA - O início ontem da remoção forçada dos colonos judeus da Faixa de Gaza transcorreu sem graves incidentes e com uma agilidade que superou as expectativas do governo de Israel. As autoridades estimam agora que o esvaziamento das 21 colônias poderá ser concluído no começo da semana que vem, em vez de no dia 4 de setembro, conforme previsto inicialmente. Um chefe militar chegou a prever que em 48 horas a desocupação estará terminada. O quadro se agravou, porém, com um atentado desfechado por um israelense contra palestinos perto da colônia judaica de Shiló, na Cisjordânia. Um colono extremista matou quatro palestinos (ler na página A19).

No maior assentamento judaico na Faixa de Gaza, o de Neve Dekalim, onde residiam 500 famílias, um grande número decidiu partir antes da meia-noite de terça-feira - prazo final dado pelo governo para a saída voluntária dos colonos, do contrário perderiam 30% das indenizações por suas propriedades. No cálculo do governo, mais de 60% das famílias residentes nos 21 assentamentos deixaram suas residências até terça-feira. Pelo menos 60 casas foram incendiadas pelos moradores que partiam e 20 pessoas, entre soldados, colonos e infiltrados, ficaram feridas, sem gravidade, em confrontos entre civis e as forças de segurança, que atuaram desarmadas. No protesto mais grave, uma mulher de 54 anos ateou fogo às roupas na cidade de Netivot, sul do país. Na colônia de Atzmona, a única de Gaza habitada por judeus ultraortodoxos, moradores saíram em fila da colônia, com as mãos para o alto e com uma estrela de David pregada nas camisas, como a que os judeus eram obrigados a usar durante o regime nazista.

Durante a remoção forçada, muitos colonos xingaram os soldados (ler mais na página A17). Houve também muito choro, momentos de confraternização, discussão e oração. Jovens radicais atiraram ovos e garrafas nas forças de segurança. As pessoas removidas eram colocadas em ônibus que as levavam para fora do território. Parte dos colonos será abrigada provisoriamente em casas pré-fabricadas, trailers e hotéis.

"É impossível observar isto sem lágrimas nos olhos", declarou o primeiro-ministro Ariel Sharon. Ele defendeu sua decisão de promover a retirada das colônias, enfatizando que essa medida tornará Israel mais seguro. Falando numa entrevista coletiva à imprensa, tendo ao lado o presidente do país, Moshe Katsav, Sharon fez um apelo aos grupos opostos à desocupação da Faixa de Gaza, conhecidos como "laranjas", a cor de sua campanha.

"Não ataquem os homens e mulheres em uniforme. Não os acusem. Não tornem as coisas mais difíceis para eles, não os machuquem. Ataquem a mim. Eu sou o responsável por isto, Ataque-me. Acusem-me", disse Sharon. "Você quer dizer, "critiquem' em vez de 'ataquem'", corrigiu Katsav. O governo e as forças de segurança temem que Sharon seja alvo de ataques de extremistas judeus, como o que matou há dez anos o primeiro-ministro Yitzhak Rabin, por ter assinado os acordos de paz com os palestinos.

Um dos promotores da colonização judaica nos territórios palestinos ocupados, Sharon afirmou que a permanência dos colonos em Gaza não foi em vão e voltou a dizer que os grandes blocos de assentamentos construídos na Cisjordânia ficarão sob controle israelense. Há 38 anos a Faixa de Gaza é ocupada por Israel. A retirada é um momento histórico por ser a primeira vez que Israel desocupa um território que os palestinos pretendem tornar parte de seu Estado.