Título: Nem escândalo paralisou negócios
Autor: Ricardo Brandt
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/08/2005, Nacional, p. A5
RIBEIRÃO PRETO - Investigado pela CPI dos Bingos por envolvimento numa suposta cobrança de propina de R$ 6 milhões e pela polícia de Ribeirão Preto num inquérito sobre formação de quadrilha especializada em fraudar licitações, o ex-assessor do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, Rogério Tadeu Buratti, pode ter mantido seus contatos em Brasília e ter feito negócios com órgãos públicos, mesmo após os escândalos. A apuração é do Ministério Público Estadual, que tenta estabelecer a relação entre Buratti e a empresa mineira MC Consulting. O proprietário da empresa, Rodrigo Cavalliere Resende, é um dos principais interlocutores de Buratti nas conversas telefônicas grampeadas entre maio e setembro de 2004.
Para os promotores do caso, há indícios de que Buratti continuou atuando de forma suspeita, por intermédio da MC Consulting, mesmo depois de seu afastamento da empresa Leão Leão (apontada como a principal beneficiada com as fraudes em licitações) e de desativar a BBS Consultores (que seria a receptora da propina de R$ 6 milhões).
A MC Consulting foi criada em 1998 e virou especialista na obtenção de verbas para prefeituras em instituições financeiras internacionais. No ano passado, foi contratada para viabilizar um financiamento para a prefeitura de Belo Horizonte. Conseguiu aprovar, no Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), um empréstimo de US$ 46 milhões para recuperação de córregos.
No final de 2004, a MC também ajudou a prefeitura de Betim (MG) a conseguir financiamento de US$ 24 milhões para obras de combate a enchente no Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (Bird).
Os dois foram os únicos empréstimos internacionais para municípios aprovados pelo Senado no ano passado.
O promotor Sebastião Sérgio da Silveira explica que uma das funções de Buratti nos esquemas de fraudes em licitações era usar seus contatos políticos para favorecer empresas ligadas a ele.
Um dos indícios de que o tráfico de influência teria continuado é uma conversa gravada dia 7 de junho. Nela, Buratti e Resende combinam o agendamento de reuniões de dois políticos com alguém de Brasília, ainda não identificado. Os dois políticos citados nas conversas são o prefeito de Joinville, Marco Tebaldi (PSDB), e o presidente do PT de Belo Horizonte, deputado estadual Roberto Carvalho.
Oito dias depois, eles voltam a conversar sobre o assunto da visita. E Buratti relata que o "amigo" de Brasília teria dito que achava que o projeto de Joinville não daria certo. "Ele (amigo de Brasília) acha que não dá certo. Ele fala que a informação que ele tem no órgão dele é que não vai conseguir ter limites para fazer muita coisa. Parece que ele (prefeito) contratou com a CEF (Caixa Econômica Federal) alguma coisa e isso piora ainda mais a situação para obter novos (financiamentos)."
A MC Consulting foi contratada pela prefeitura de Joinville em 23 de fevereiro deste ano, por R$ 116 mil, para viabilizar empréstimo no BID para um projeto de gestão ambiental de US$ 49,5 milhões. O financiamento estava em negociação desde o início de 2004.
O prefeito tucano de Joinville disse se lembrar da visita, mas nada saber sobre as conversas. Ele afirmou que esteve em Brasília, na Comissão de Financiamento Externo (Cofiex) - órgão que centraliza os pedidos de empréstimo internacional. "Não lembro especificamente quem me recebeu." Vinculada ao Ministério do Planejamento, a Cofiex tem 10 membros, 3 deles do Ministério da Fazenda.
"Apesar de ser do PSDB, fizemos um contrato com essa empresa (MC Consulting), pois além da parte técnica eles tinham muitos contatos políticos em Brasília", diz Tebaldi.
Carvalho disse ser amigo de Resende, mas negou que ele tenha intermediado encontro em Brasília. "Fui muitas vezes a Brasília no ano passado acompanhando o prefeito (de Belo Horizonte) Fernando Pimentel."
Buratti e Resende não se recordam da conversa, dizem que são amigos e negam qualquer relação comercial entre eles nos negócios.
O primeiro disse achar pouco provável que isso tenha ocorrido, pois, teria perdido a maior parte dos contatos em Brasília.
Resende garante que a MC tem atuação estritamente técnica e nunca usou contatos políticos para se favorecer. "Nunca usei o Rogério para marcar nada." Ele disse que o máximo que pode ter feito é pedido conselhos.