Título: Até 16 horas na fila. Muitos não são atendidos
Autor: Aiana Freitas
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/08/2005, Economia & Negócios, p. B4

O desespero e a esperança de receber o benefício o mais rapidamente possível levaram milhares de segurados a formar filas nas agências da Previdência Social na cidade de São Paulo ontem, primeiro dia da volta ao trabalho dos servidores após 76 dias de greve. Muitos foram na véspera à tarde para garantir o atendimento. Maria Anastácio, 52 anos, e o marido, Sebastião Senni, 78 anos, receberam a senha n.º 1 na agência Santa Marina. Isso porque ficaram 16 horas na fila, das 16h de terça-feira às 8h de ontem, para entrar com recurso para a concessão da aposentadoria por invalidez. Atrás deles estava a auxiliar de limpeza Regina Fátima Braga, 52 anos, que ficou 15 horas na fila - e mais 2 horas em ônibus e trem para chegar à agência. "A empresa onde trabalhava era aqui perto, por isso dei entrada no pedido neste posto. Agora, sou obrigada a vir aqui sempre que preciso."

Com as senhas 3 e 4, a desempregada Marinalva Pereira da Silva, 40 anos, e a amiga Lúcia Helena Venâncio, 47, chegaram ao posto perto de 18h de terça-feira, vindas da cidade de Cajamar. Marinalva foi marcar perícia para a mãe Expedita Pereira, 75 anos, que tem artrose e dificuldade para caminhar. Para passar a noite, as amigas levaram pão com mortadela, biscoito e uma garrafa de café.

Perto delas, a dona de casa Maria José de Barros Ribeiro, 65 anos, aguardava ansiosa a abertura da agência. "Preciso desbloquear o auxílio-doença do meu marido. Ele foi operado da próstata, tem diabetes e está com pressão alta. Mas há dois meses não recebe o benefício de R$ 800. O aluguel e a luz estão atrasados, estamos quase passando fome, não tem nem sal."

Segundo o funcionário da agência que distribuía as senhas, seriam entregues 750 números. A fila dobrava a esquina da Avenida Santa Marina e seguia pela Avenida Ermano Marchetti, com cerca de 500 pessoas. Mas, quando a agência encheu, as portas foram fechadas.

No posto da Água Branca, na Avenida Francisco Matarazzo, o número de pessoas na fila era menor, mas a incerteza quanto à abertura era maior. Com o filho Maicon de 2 anos em um braço e uma sacola cheia de papéis no outro, Márcia Soares de Jesus, 42 anos, estava aflita com a possibilidade de não ser atendida. "Cheguei às 3h da manhã. Agora, nem os funcionários que entraram nem os guardas sabem informar se vão atender ou não." Márcia aguarda a concessão da pensão por morte do companheiro desde setembro de 2002. "Tive de provar que morei com ele por 8 anos, mas sempre faltava um documento. Agora, acho que a papelada está completa. Segura essa sacola. Deve ter uns cinco quilos de papel. Não saio daqui sem dar entrada no pedido."

A agência abriu às 8h, mas nem todos puderam entrar. A escriturária Assumpta Lizié, 51 anos, que queria dar entrada na aposentadoria por tempo de contribuição, foi barrada. "Estamos dando prioridade para pedidos de auxílio-doença, salário-maternidade e aposentadoria por invalidez. Volta daqui a 15 dias", pediu a funcionária da triagem. "Não tenho culpa da greve e sou prejudicada. Muitos servidores ganham bem, estão pleiteando o quê?", perguntou indignada.

No posto de Santo Amaro, o maior do Brasil, a situação estava sob controle por volta das 9h de ontem. Segundo a gerente-executiva Lúcia Helena Paquiré, foram distribuídas 540 senhas. Teve quem não agüentou esperar. Marli de Oliveira, 48 anos, passou mal e foi socorrida por uma ambulância.

Na agência de Pinheiros, a realidade era outra. "Por causa da fila, abrimos a porta às 6h e fechamos às 7h15, porque não havia condição de atender. Estamos trabalhando com um terço do pessoal", explicou um funcionário.